Alessandro Kioshi Kishino¹
Membro Filiado ao Instituto Brasileiro de Direito Desportivo – IBDD
Nas últimas semanas, a comunidade esportiva nacional vem acompanhando diversas notícias sobre o inquérito instaurado no Tribunal de Justiça Desportiva do Futebol do Estado de São Paulo – TJD/SP, a pedido da Sociedade Esportiva Palmeiras, que visa apurar a existência de infração disciplinar e a determinação de autoria em episódio ocorrido na partida final do Campeonato Paulista de Futebol A1, do ano de 2018.
Contudo, apesar do assunto render uma série de reportagens e matérias jornalísticas, poucas foram as manifestações efetivamente técnicas sobre o expediente que tramita na Justiça Desportiva, especialmente analisando se o objetivo principal inicialmente almejado pela Sociedade Esportiva Palmeiras, e a viabilidade jurídica do mesmo.
E, com o único intuito de demostrar que o resultado do jogo final do Paulistão 2018 não pode mais ser alterado, nos atrevemos a apresentar, nestas breves linhas, os procedimentos especiais denominados “Inquérito” e “Impugnação de Partida, Prova ou Equivalente”, regulamentados no Código Brasileiro de Justiça Desportiva, nos artigos 81 a 87.
E para um melhor entendimento do assunto, tomamos a liberdade de transcrever dois artigos do Código Brasileiro de Justiça Desportiva, que servem de apoio para a análise do tema:
“Art. 81. O inquérito tem por fim apurar a existência de infração disciplinar e determinar a sua autoria, para subsequente instauração da ação cabível, podendo ser determinado de ofício pelo Presidente do Tribunal competente (STJD ou TJD), ou a requerimento da Procuradoria ou da parte interessada”.
“Art. 84. O pedido de impugnação deverá ser dirigido ao Presidente do Tribunal (STJD ou TJD), em duas vias devidamente assinadas pelo impugnante ou por procurador com poderes especiais, acompanhado dos documentos que comprovem os fatos alegados e da prova do pagamento dos emolumentos, limitado às seguintes hipóteses:
I – modificação de resultado;
II – anulação de partida, prova ou equivalente”.
E fazendo uma simples leitura dos dois diplomas legais acima transcritos, podemos notar a flagrante diferença entre os dois procedimentos: enquanto o inquérito serve para verificar a existência de uma infração disciplinar e apurar a sua autoria, a impugnação objetiva a alteração do resultado ou a anulação de determinada partida.
Em razão desta diferença técnica, não nos parece factível se falar, como já foi noticiado em diversas matérias jornalísticas, em possibilidade jurídica de alteração do resultado ou de anulação da partida final do Campeonato Paulista de Futebol A1 de 2018.
E fazemos tal afirmação com absoluta tranquilidade, pois o procedimento especial de inquérito já foi finalizado, com a determinação, pelo auditor processante, do seu arquivamento, em razão da não identificação de nenhuma infração disciplinar. O CBJD, neste aspecto, não prevê qualquer recurso desta situação, eis que sequer o arquivamento do inquérito é considerado uma “decisão”.
Ainda, e aqui uma observação bastante relevante, a impossibilidade do manejo, por parte da Sociedade Esportiva Palmeiras, de um pedido de impugnação de partida, eis que já não há mais tempo hábil para a apresentação de tal pedido, pois o prazo legal para a apresentação da impugnação é de 02 (dois) dias, contados da entrada da súmula do jogo na sede da Federação Paulista de Futebol.
Veja o que diz o artigo 85, do CBJD:
“Art. 85. A impugnação deverá ser protocolada no Tribunal (STJD ou TJD) competente, em até dois dias depois da entrada da súmula na entidade de administração do desporto”.
Os artigos referentes ao inquérito não postulam a interrupção do prazo prescricional, decadencial ou preclusivo de atuação da parte interessada, motivo pelo qual, insiste-se, o prazo para impugnação da partida se encerrou 2 (dois) dias após a entrada da súmula na entidade paulista.
Ainda, oportuno destacar que não nos parece crível que a Justiça Desportiva, em equivocada extensão ao princípio da fungibilidade, possa aceitar que um pedido de abertura de inquérito seja conhecido como um pedido de impugnação de partida, especialmente porque, como visto acima, os objetivos dos procedimentos são absolutamente diferentes, sem sequer vislumbrar os procedimentos e características próprias, tais como a procuração com poderes específicos ou o recolhimento antecipado dos emolumentos (art. 84, CBJD).
Por estar encerrado o prazo, entendemos que sequer cabe recurso ao STJD, muito menos ao CAS, eis que requisitos extrínsecos do procedimento não são atendidos.
Assim, sem adentrar ao mérito do que efetivamente ocorreu no lance, afirmamos, sem a menor dúvida, de que o resultado da partida final do Campeonato Paulista de Futebol A1 de 2018 é definitivo, eis que já homologado pela Fed. Paulista de Futebol, não podendo ser alterado ou modificado, não havendo, em nossa modesta opinião, qualquer possibilidade técnica de mudança em tal cenário.
¹Advogado, Especialista em Direito Desportivo, Membro do IBDD, Ex-Subprocurador Geral do STJD do Futebol, Presidente do STJD dos Desportos Aquáticos, e auditor do STJD do Ciclismo, do STJD da Liga Futsal e do STJD do Judô
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