DO ACIDENTE DE TRABALHO, DA ESTABILIDADE PROVISÓRIA E DA REINTEGRAÇÃO DOS ATLETAS PROFISSIONAIS

Filipe Orsolini Pinto de Souza

Membro Filiado ao IBDD

 

Mais do que em qualquer outra profissão, os atletas profissionais convivem, diariamente, com o risco de acidente de trabalho, ao passo que o exercício das suas funções ocorre em treinamentos e jogos, com exigência física intensa e exposição ao trauma.

Como ensina Maurício de Figueiredo Corrêa da Veiga, “quando se fala em ‘acidente de trabalho’, fala-se do gênero que pode ser dividido nas seguintes espécies: acidente-tipo, doenças ocupacionais e acidente por equiparação legal, que são disciplinados respectivamente nos arts. 19, 20 e 21 da Lei n. 8213/91, que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social[fusion_builder_container hundred_percent=”yes” overflow=”visible”][fusion_builder_row][fusion_builder_column type=”1_1″ background_position=”left top” background_color=”” border_size=”” border_color=”” border_style=”solid” spacing=”yes” background_image=”” background_repeat=”no-repeat” padding=”” margin_top=”0px” margin_bottom=”0px” class=”” id=”” animation_type=”” animation_speed=”0.3″ animation_direction=”left” hide_on_mobile=”no” center_content=”no” min_height=”none”][i].

Existem aquelas lesões corriqueiras que abreviam a participação do atleta em uma sessão de treinamento ou em um jogo, mas não trazem consequências mais graves para a continuidade do desempenho de suas atividades, entretanto, existem acidentes de trabalho, doenças profissionais ou ocupacionais que trazem a inaptidão ao exercício da profissão por períodos mais extensos, como quando se exige intervenção cirúrgica, por exemplo.

Nesse contexto, remete-se ao instituto jurídico da estabilidade provisória, previsto no artigo 118 da Lei nº 8.213/91, definido pelo Ministro do Tribunal Superior do Trabalho Maurício Godinho Delgado como a garantia provisória “do empregado acidentado, que se estende pelo ‘prazo mínimo’ de 12 meses, ‘após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente de percepção de auxílio acidente’”[ii].

Dentre as controvérsias oriundas das disposições legais acerca do acidente de trabalho e da estabilidade provisória dele decorrente, o Tribunal Superior do Trabalho editou a Súmula nº 378, reconhecendo a constitucionalidade do artigo 118 da Lei nº 8.213/91 e trazendo, como pressupostos da garantia provisória, o afastamento superior a 15 dias e a consequente percepção do auxílio-doença acidentário, ressalvados os casos em que se constate o nexo causal entre a doença profissional e a execução do contrato de emprego após a despedida.

Com bastante relevância para as relações entre clubes e atletas, a referida Súmula nº 378 definiu que “o empregado submetido a contrato de trabalho por prazo determinado goza da garantia provisória de emprego decorrente de acidente de trabalho prevista no art. 118 da Lei nº 8.213/91”. Não se pode olvidar, os contratos de trabalho dos atletas profissionais possuem prazo determinado, nunca inferior a três meses e não superior a cinco anos, de acordo com o artigo 30 da Lei nº 9.615/98.

Com base na Lei nº 8.213/91, na Súmula nº 378 do Tribunal Superior do Trabalho e na Lei nº 9.615/98, é possível concluir que o atleta profissional que tenha suportado acidente de trabalho, doença profissional ou ocupacional, com afastamento superior a 15 dias e percepção de auxílio-doença acidentário, possui estabilidade provisória pelo prazo mínimo de 12 meses após a cessação do benefício previdenciário, a despeito do decurso do contrato por prazo determinado.

Não raro a relação entre os direitos decorrentes do acidente de trabalho e a duração dos contratos por prazo determinado enseja conflitos entre atletas empregados e clubes empregadores. Em outras palavras, é comum que o contrato encontre seu termo enquanto o atleta ainda está incapacitado para o trabalho ou durante o período de estabilidade provisória, ainda que não esteja afastado pelo INSS. Essa situação, na prática, causa desencontros entre as partes.

Não é fácil para um atleta que acabou de se recuperar de lesão que o tenha incapacitado para o trabalho retomar o curso de sua carreira. Se ainda estiver no clube em que sofreu acidente de trabalho, provavelmente já foi feita a reposição; se tiver que procurar outro clube, a desconfiança sobre a condição física será sempre tema da negociação.

O período de estabilidade se presta, portanto, a permitir que o atleta recupere a sua capacidade de trabalho, de maneira plena, desde as condições físicas até as psicológicas, e esteja, dentro do possível, como estava antes do acidente de trabalho. Ao término da estabilidade provisória, o jogador poderá ter retomado a sua posição no mesmo clube ou, ainda, ter mostrado ao mercado que está definitivamente recuperado.

No contexto de casos em que o atleta foi dispensado pelo clube durante a incapacidade decorrente do acidente de trabalho, decisões da Seção Especializada em Dissídios Individuais – 1 do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região[iii] e da 2ª Seção Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região[iv] reforçam o direito à reintegração, em sede de tutela provisória, para que seja respeitada a legislação e a jurisprudência vigentes. Segue excerto do referido pronunciamento da SDI–1 do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região:

Também observou o Juízo que o Réu não negou que o acidente em 30.07.2016 noticiado nos autos tenha se dado em decorrência da prestação de serviços, razão pela qual o reputou como acidente de trabalho, o qual resultou em lesão ainda não estabilizada, reconhecendo que, em tese, o Autor seria beneficiário da garantia de emprego de que trata o art. 118, da Lei 8.213/1991 (Súmula 378, III, do E. TST) (…).

Ora, o reclamante está acidentado e em tratamento, usufruindo da estabilidade prevista no art. 118 da Lei 8.213/91.

Aplicável, in casu, o inciso IV do art. 311 do CPC, eis que o autor instruiu a inicial com provas e a reclamada não opôs prova capaz de gerar dúvida razoável, além do que não negou que o reclamante houvesse prestado serviços no período e se acidente no trabalho.

(MS 1001253-34.2017.5.02.0000 SDI-1 TRT2ª Região – Rel. Rilma Aparecida Hemeterio – Data de Publicação 05/12/2017)

A recuperação do jogador que suportou acidente de trabalho, doença profissional ou ocupacional é extremamente relevante para a sua carreira, que é notoriamente breve, sendo que os direitos decorrentes da estabilidade provisória, destacadamente a reintegração, são ferramentas imprescindíveis oferecidas pela legislação e jurisprudência “em atenção à situação desfavorável que se encontrará o empregado[v], especialmente àquele que faz da prática esportiva a sua profissão.

Filipe Orsolini Pinto de Souza

Mestre em Direito Desportivo Internacional pelo ISDE – Instituto Superior de Derecho y Economia (Espanha), Pós-Graduado em Direito Desportivo pela Escola Superior de Advocacia da OAB/SP, Pós-Graduado em Direito Empresarial pela FGV – Fundação Getúlio Vargas, graduado pela FACAMP – Faculdades de Campinas, Participante do Programa de Negociação da Harvard Law School Executive Education, membro da Comissão de Direito Desportivo da OAB Subsecção Campinas/SP, Membro da Comissão de Direito Desportivo da OAB Seção São Paulo, membro do IBDD – Instituto Brasileiro de Direito Desportivo, membro do ISDE Sports Law Alumni e Membro da Association Internationale des Avocats du Football – AIAF.

[i] VEIGA, Maurício de Figueiredo Corrêa da. Manual de Direito do Trabalho Desportivo. São Paulo: LTr, 2016. p. 193.

[ii] DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 11ª edição. São Paulo: LTr, 2012. p. 1.281.

[iii] Mandado de Segurança nº 1001253-34.2017.5.02.0000 SDI-1 TRT2ª Região – Rel. Rilma Aparecida Hemeterio – Data de Publicação 05/12/2017.

[iv] Mandado de Segurança nº 0007252-22.2017.5.15.0000 SDI-1 TRT15ª Região – Rel. Manuel Soares Ferreira Carradita – Data de Publicação 14/12/2017.

[v]MANUS, Pedro Paulo Teixeira. Direito do Trabalho. 16ª edição. São Paulo: Atlas, 2015. p. 173.

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