Gustavo Lopes Pires de Souza
A empresa Parlamento Restaurante Ltda propôs ação contra a CBF sob o fundamento de que teria firmado contrato com a FBF – Federação Brasiliense de Futebol para fornecer bebidas e comidas no Estádio Mané Garrincha em qualquer evento realizado pela entidade.
Como a CBF proíbe a venda de bebidas alcoólicas nos estádios de futebol, requereu a antecipação de tutela para que fosse permitida a venda de cerveja no Mané Garrincha, em alguns “Jogos teste”. O pedido antecipatório de tutela foi deferido.
Em razão desta decisão, o Ministério Público apresentou recurso contra a decisão, sob o fundamento de que a permissão seria temporária é só valia para os eventos organizados pela FIFA, por isso, os demais jogos deveriam seguir o Estatuto do Torcedor.
Segundo a juíza Grace Correia Pereira “a abrangência da antecipação de tutela deferida diz respeito somente aos “jogos teste”, e atualmente não há qualquer evento futebolístico a ser realizado no Estádio Nacional de Brasília desta categoria”.
Destarte, ao contrário do que afirmou a Magistrada, o Estatuto do Torcedor não proíbe a venda de bebidas alcoólicas. Destarte, art. 13-A do referido Estatuto estabelece como condição de acesso e permanência do torcedor no recinto esportivo não portar objetos, bebidas ou substâncias proibidas ou suscetíveis de gerar ou possibilitar a prática de atos de violência.
Ora, não há qualquer vedação expressa à venda de bebidas alcoólicas e eventual proibição incorre em grave violação ao inciso II da Constituição Brasileira ao dispor que ninguém poderá fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de Lei.
Vale destacar que o documento que originou a proibição de venda/consumo de bebidas alcoólicas é foi Termo assinado entre Conselho Nacional dos Procuradores Gerais do Ministério Público dos Estados e CBF.
O MP defende que as bebidas alcoólicas são causa da violência e apresenta citações, porém não há qualquer fonte ou documento que comprove cientificamente a redução na violência nos estádios de futebol a partir da proibição da venda e do consumo de bebidas alcoólicas.
Doutro giro, estudo publicado na Inglaterra por Geoff Pearson e Arianna Sale em 2011 ( PEARSON & SALE “’On the Lash’: revisiting the effectiveness of alcohol controls at football matches” in: Policing & Society, Vol. 21, No. 2, June 2011.) aponta que a política de restrição à bebida alcoólica nos estádios não é fator determinante para a redução dos índices de violência.
Segundo o estudo, devem-se buscar outros métodos para reduzir a violência no futebol e apresenta resultados de um estudo etnográfico de quinze anos nas torcidas inglesas e entrevistas com autoridades policiais do Reino Unido e da Itália.
A conclusão é de que, além de não impedir a violência nos estádios de futebol, a proibição da venda de bebidas alcoólicas podem aumentá-la pela seguinte razão:
1) Os torcedores aumentam a quantidade ingerida de bebida antes de entrar no estádio e passam a ingerir bebidas mais fortes;
2) Entram no estádio em cima da hora do jogo, dificultando o esquema de segurança e gerando tumulto;
3) Os torcedores se concentram nos bares dos arredores, aumentando a chance de encontro entre torcedores rivais, em espaços sem esquemas de segurança.
Ademais, a referida proibição gera uma série de problemas:
1) Concentra a entrada do público em cima da hora do jogo, gerando: Aumento de filas; Aumento de catracas utilizadas; Aumento de custos; Aumento de tumulto e violência no acesso ao Estádio;
2) Estádio perde receita (restaurantes, lojas, eventos antes do jogo…);
3) Torcedor consome ainda mais bebida, com maior velocidade, inclusive bebidas quentes, sabendo que a bebida é proibida dentro do Estádio;
4) Pessoas circulando na rua, dificultando o tráfego e o acesso ao Estádio
O fato é que o Poder Público na ânsia de dar uma reposta à sociedade e apontar soluções para a crescente violência nos estádios de futebol, escolheu a bebida alcoólica como vilã.
Tal indicação sem fundamentos torna-se ainda mais cristalina ao se buscar as reais causas da violência nos estádios de futebol e, sobretudo, quando constata-se que o Brasil possui índices de violência nos estádios de futebol largamente superiores aos de países como Inglaterra que permite a venda de bebidas alcoólicas.