O problema da redutibilidade da cláusula penal do contrato de atleta de futebol

12.08.2008
Uma análise específica dos incisos do parágrafo 4° do artigo 28
Pedro Zanette Alfonsin

 
O parágrafo 4º do artigo 28 da Lei 9.615 de 2001, denominada Lei Pelé, estabeleceu que o valor da cláusula penal do contrato de trabalho do atleta profissional com o clube de futebol terá obrigatoriamente redução progressiva, estabelecendo nos seus quatro incisos após o primeiro ano até o quinto ano, variando progressivamente de 10 por cento até oitenta por cento.

Quando o contrato é pelo prazo de cinco anos a norma se adequa perfeitamente a realidade. O problema surge quando se tem uma vigência inferior. O artigo 30 da Lei Pelé determina que o prazo terá duração nunca inferior a três meses nem superior a cinco anos não fazendo qualquer distinção qualitativa entre um prazo menor ou um prazo maior.

O tempo de vigência do contrato é determinado exclusivamente pelo interesse das parte. Não interessa ao mundo jurídico se é conveniente aos contratantes estabelecer, por exemplo, um contrato de seis meses , três anos ou cinco anos desde que se obedeça dois critérios: O da obrigatoriedade de se determinar um prazo final, e que este não seja inferior a três meses nem superior a cinco anos.

Apesar de ser um contrato de trabalho, e ser regido por lei específica, quando o assunto é incumprimento das obrigações, somos obrigados a fazer o dialogo das fontes não podendo deixar de ler as diretrizes do Novo Código Civil e especificamente do Capítulo V do título IV, mais precisamente do artigo 413 , que trata da redução das cláusulas penais por cumprimento parcial.

A melhor doutrina civilista não nos deixa pensar de forma diferente. Judith Martins-Costa, nos comentários ao artigo 413 ensina que “É dever de proporcionalidade que está no fundamento da primeira fattispecie, qual seja, a redução quando a obrigação principal houver sido em parte cumprida. A proporcionalidade tem sido considerada, de maneira corrente, um princípio constitucional implícito.”.

Diferentemente do Código Civil de 1916, o novo código obriga o juiz a reduzir eqüativamente a penalidade se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte. No artigo 924 do antigo Código vigia a expressão “poderá o juiz reduzir em parte”, sendo modificada pelo artigo 413 por “deverá ser reduzida eqüitativamente pelo juiz”.

No direito do trabalho o postulado da proporcionalidade é utilizado no pagamento de indenização nas rescisões unilaterais de contrato por prazo determinado tendo o artigo 479 estabelecido como quantum da indenização, a metade da remuneração a que teria direito até o termo do contrato. Tendo então relação de proporcionalidade com o tempo que ainda tinha o funcionário por trabalhar.

Sendo assim, não se pode entender por exemplo que o 4º § do artigo 28 da Lei Pelé, quando no silêncio do contrato, proíbe a redução da cláusula penal do contrato de atleta de futebol de 1 ano de duração ainda mais quando se trata de rescisão por parte do trabalhador tendo em vista o princípio da hipossuficiência do trabalhador em relação ao empregador.

O princípio da proteção do hipossuficiente, aplica-se perfeitamente ao caso, pois fere o postulado da razoabilidade, ao contrario dos contratos normais de trabalho e da sociedade civil, o atleta que cumprir quase todo prazo determinado estabelecido em seu contrato tenha que pagar a integralidade da cláusula penal, como ocorre naqueles com duração menor a um ano.

Chega-se a conclusão que os incisos do parágrafo 4º do artigo 28 são meramente exemplificativos e não taxativos valendo somente para o contrato de 5 anos de vigência, podendo-se utilizar para outros períodos de vigência como critério de mensuração o postulado da proporcionalidade para utilização do princípio da eqüidade, evitando-se assim que a cláusula penal se transforme em instrumento de ilegítimo exercício do maior poder contratual, ou via para o enriquecimento injustificado, ou para consagração da injustiça contratual.

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§ 4° Far-se-á redução automática do valor da cláusula penal prevista no caput deste artigo, aplicando-se, para cada ano integralizado do vigente contrato de trabalho desportivo, os seguintes percentuais progressivos e não-cumulativos:
I – dez por cento após o primeiro ano;
II – vinte por cento após o segundo ano;
III – quarenta por cento após o terceiro ano;
IV – oitenta por cento após o quarto ano.

Art. 30. O contrato de trabalho do atleta profissional terá prazo determinado, com vigência nunca inferior a três meses nem superior a cinco anos.

Marques, Claudia Lima. Comentários ao código defesa do consumidor – 2. ed. Ver., atual. E ampl. – São Paulo : Revista Editora dos Tribunais, 2006. Pg 26.

Art. 413. A penalidade deve ser reduzida eqüitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio.

Martins-Costa, Judith, Comentários ao novo Código Civil, Volume V, Tomo II: Do inadimplemento das obrigações. – Rio de Janeiro: Forense, 2004. Pg 470

Art. 924. Quando se cumprir em parte a obrigação, poderá o juiz reduzir proporcionalmente a pena estipulada para o caso de mora, ou de inadimplemento.

Art. 479 – Nos contratos que tenham termo estipulado, o empregador que, sem justa causa, despedir o empregado será obrigado a pagar-lhe, a titulo de indenização, e por metade, a remuneração a que teria direito até o termo do contrato.

* Pedro Zanette Alfonsin ([email protected]) é advogado especializado em direito desportivo e membro do GEDD.

Fonte:Universidade do Futebol

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