Aurelio Franco de Camargo e Ricardo Souza Calcini
No último dia 6.3.2014, em notícia veiculada no site do Tribunal Superior do Trabalho, ganhou repercussão na imprensa esportiva a seguinte manchete: “TST reconhece responsabilidade objetiva de clube de futebol em lesão de jogador”.
No caso, ora analisado pela Corte Superior Trabalhista, segundo infere-se da leitura da matéria informativa, abordou-se a situação de um jogador que, no exercício de sua atividade profissional, lesionou o seu calcanhar esquerdo. Assim, e conquanto tivesse recebido o competente tratamento médico custeado entidade esportiva, “in casu” o Joinville Esporte Clube, permaneceu total e definitivamente incapacitado para a prática desportiva, já que não obtido êxito na reversão do quadro clínico da lesão por ele acometida.
O processo, oriundo do E. TRT/SC da 12ª Região, chegou ao Colendo Tribunal Superior do Trabalho após recurso de revista interposto pelo jogador/reclamante da ação trabalhista. Distribuído o apelo ao Ministro Walmir Oliveira da Costa, integrante da 1ª Turma, decidiu-se por condenar o clube/reclamado, entre outros, no pagamento de indenização por dano moral, além de indenização por danos materiais, no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) cada uma delas.
A par do exposto, e sem adentrar no mérito das indenizações e seus respectivos valores arbitrados, discute-se aqui, em vista da relevância da matéria, a questão propriamente dita do alcance da responsabilidade da entidade desportiva pelo evento danoso suportado por seu atleta.
De se ver, pois, a partir da leitura do v. acórdão – extraído do processo nº TST-RR-393600-47.2007.5.12.0050 – que o Tribunal de origem entendeu que a lesão do atleta não decorreu de comportamento desidioso de parte do clube, ou mesmo que este tenha agido com descuido em relação ao cumprimento das normas de segurança, higiene e saúde do trabalho, afastando assim sua responsabilidade pela ocorrência do acidente de trabalho sofrido pelo jogador.
Contudo, e com base na previsão do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, o TST entendeu por aplicar a responsabilidade objetiva, afastando a incidência da regra matriz prevista no inciso XVIII, do artigo 7º, da Constituição Federal. E o fez corretamente, senão vejamos.
É certo que, no âmbito do direito do trabalho, em matéria atinente à responsabilidade civil pelos acidentes de trabalho e/ou doenças a ele equiparadas, vigora, regra geral, a responsabilidade subjetiva do empregador, cuja obrigação de indenizar o dano dá-se mediante comprovação de sua conduta culposa ou dolosa.
Entrementes, e com fulcro na cabeça do citado artigo 7º da Carta da República, infere-se que o Legislador Constituinte não criou qualquer óbice à extensão de outros direitos que visem à melhoria da condição social dos trabalhadores, entendendo significativa parcela da doutrina e jurisprudência que o dispositivo constitucional trata apenas de “direitos mínimos”. Desta feita, defende-se aqui a possibilidade da tese da responsabilidade objetiva da empresa, a qual encontra fundamento legal nos comandos dos artigos 200, VIII, e 225, § 3º, ambos da Constituição Federal, e dos artigos 927, 932, 933 e 942, todos do Código Civil Brasileiro.
Ademais, importante salientar as palavras do Ministro Walmir Oliveira da Costa, relator do recurso, no sentido de que, em vista da peculiaridade da prática desportiva, “(…) o risco de lesões a que submetido o atleta profissional é tão expressivo que o legislador ordinário passou a exigir que o respectivo clube empregador contrate seguro de vida e de acidentes pessoas, com o objetivo, expresso, de ‘cobrir os riscos a que eles estão sujeitos’ (…)”.
Nesse sentido, é a obrigação imposta às entidades de prática desportiva, ora contida no artigo 45 da Lei nº 9.615/98, com a redação dada pela Lei nº 12.395/2011, para que contratem, a favor de seus atletas profissionais, ou aos beneficiários por eles indicados no contrato, apólice de seguro apta a assegurar indenização mínima correspondente ao valor anual da remuneração pactuada entre as partes.
Destarte, e na vertente fixada pelo Tribunal Superior do Trabalho, é de conhecimento público, não dependendo de prova por ser notório (CPC, art. 334, I), que as atividades desenvolvidas pelos atletas de futebol, em momentos de treinamentos e/ou em competições esportivas, exigem não só um desgaste psicológico, mas sobretudo físico. Daí a ocorrência de diversas lesões que, não raros os casos, acabam por afastar o jogador do pleno exercício de suas atividades profissionais, em cujas situações extremas – como no caso submetido ao julgamento pelo TST – importam na aposentadoria forçada dos gramados.
Portanto, pugna-se pela aplicação da teoria da responsabilidade objetiva para os casos de acidentes de trabalho sofridos pelos jogadores de futebol, haja vista o sabido risco da atividade profissional, tese esta que preserva, por conseguinte, a unidade, a harmonia e a efetividade da própria Constituição Federal de 1988.