Gustavo Delbin¹
Mariana Chamelette²
“O esporte tem uma capacidade de resiliência que é inigualável. Esperamos ter muitas razões para celebrar logo depois do final dos Jogos Paralímpicos. Desejamos que os atletas possam buscar a realização de tudo aquilo que se prepararam ao longo desses cinco anos e que consigam a melhor participação da nossa história.”
Mizael Conrado
O esporte, sem nenhuma dúvida, tem papel social que vai além da mera prática física-desportiva, tendo, em si, relevantes aspectos culturais e pedagógicos, nas suas formas de manifestação e na maneira como é transmitido à sociedade. Tal questão é reflexo de diversos âmbitos do desporto, dentre os quais, o do esporte paralímpico.
Conforme já discorrido com profundidade por um dos autores desta coluna anteriormente, em setembro de 2020, o Movimento Paralímpico nasceu na década de 1940, com a finalidade de incentivar competições entre os veteranos e os civis atingidos pela II Guerra Mundial³. Portanto, o esporte paralímpico nasceu como um evento com objetivos terapêuticos e sociais.
A palavra “paralímpico” tem origem grega, na aglutinação da preposição “para”, que tem o significado de “ao lado, paralelo” e da palavra “olímpico”, em referência[fusion_builder_container hundred_percent=”yes” overflow=”visible”][fusion_builder_row][fusion_builder_column type=”1_1″ background_position=”left top” background_color=”” border_size=”” border_color=”” border_style=”solid” spacing=”yes” background_image=”” background_repeat=”no-repeat” padding=”” margin_top=”0px” margin_bottom=”0px” class=”” id=”” animation_type=”” animation_speed=”0.3″ animation_direction=”left” hide_on_mobile=”no” center_content=”no” min_height=”none”][4] à realização correlata entre os Jogos Olímpicos e os Jogos Paraolímpicos[5].
Os Jogos Paralímpicos são organizados a partir dos mesmos princípios e valores basilares que regem os Jogos Olímpicos. Assim sendo, são realizados a cada quatro anos, contando com a participação de diferentes nações em evento facultado aos atletas ranqueados, que ocupem posições de destaque em cada uma das modalidades disputadas.
Os Jogos Olímpicos e os Jogos Paralímpicos, realizados de maneira correlata desde 1960 (Roma) e dividindo a mesma cidade sede desde 1988 (Seul), compartilham do mesmo espírito de potencialização do corpo e da valorização da saúde e do esporte.
No entanto, em que pese a relação existente entre olimpismo e paralimpismo, as diversas formas de deficiência impõem à organização dos Jogos Paralímpicos, ao Comitê Paralímpico Internacional (IPC) diferentes desafios, dentre os quais o de resguardar a paridade, a par conditio, nas competições.
Nesse contexto, a solução encontrada foi agrupar competidores em categorias que levam em conta o grau de comprometimento apresentado pelos atletas. Assim, os atletas competem em categorias, dentro de cada modalidade específica, classificados em critérios de ordem médica e funcional. Os critérios médicos são aqueles ligados ao nível mínimo de deficiência e os critérios funcionais são os relacionados à capacidade funcional do atleta em relação às habilidades específicas da modalidade.
Atualmente, fazem parte do programa dos Jogos Paralímpicos de Verão, 22 modalidades (atletismo, tênis de mesa, tênis em cadeira de rodas, natação, halterofilismo, hipismo, triatlo, canoagem, remo, judô, bocha, ciclismo, tiro com arco, tiro esportivo, esgrima em cadeira de rodas, futebol de 5, goalball, parabadminton, parataekwondo, basquete em cadeira de rodas, vôlei sentado e rúgbi em cadeira de rodas)[6].
Para cada modalidade, há previsão de um sistema de classificação específico, que é avaliado a partir de avaliações realizadas previamente (físicas, médicas, técnicas), além da própria observação dos competidores, dentro e fora das disputas.
Os atletas são, então, classificados, por meio de números intransferíveis para outras modalidades e que, em regra, são precedidos da letra inicial do nome da modalidade esportiva em inglês.
Por exemplo, no atletismo, os atletas que disputam as provas de rua e de pista são categorizados a partir da letra “T”, do termo “track”, sucedida das classes[7]: T11 a T13 – deficiências visuais; T20 – deficiência intelectual; T31 a T34 – deficiências de coordenação motora que competem em cadeira de rodas; T35 a T38 – deficiências de coordenação motora que competem em pé; T40 e T41 – baixa estatura; T42 a T44 – deficiência nos membros inferiores que competem sem prótese; T51 a T54 – deficiência nos membros inferiores que competem em cadeiras de rodas; T61 a T64 – deficiência no membros inferiores que competem com prótese; RR1 a RR3 – atletas com deficiência de coordenação severa (hipertonia, ataxia, atetose) que competem na petra[8]
No site do Comitê Paralímpico Brasileiro é possível se extrair cada uma das classificações existentes nas modalidades[9]. É importante destacar, contudo, que tais classificações estão em constante atualização e que, a partir da alteração de tais critérios ou de alterações na própria deficiência, a classificação recebida por um atleta pode ser alterada ao longo da carreira. Assunto inclusive bastante polêmico e que gerou protestos e disputas jurídicas desportivas com atletas brasileiros, a exemplo do nadador multicampeão André Brasil[10].
No próximo dia 24 de agosto, após cinco anos de espera, a pira paralímpica será acesa em Tóquio.
O Brasil, que já subiu ao lugar mais alto do pódio 87 vezes em edições anteriores, poderá alcançar a sua centésima medalha dourada pela delegação, nesta edição, composta por 260 atletas, incluídos atletas sem deficiência (timoneiros, guias, calheiros e goleiros), de 22 estados e do DF[11].
A participação brasileira nos Jogos Paralímpicos de Tóquio já é histórica. Isso porque o tamanho da delegação de atletas brasileiros, que é composta por 164 homens e 96 mulheres, só é superado pela participação nos Jogos sediados no país, oportunidade em que assegurou a participação em todas as modalidades.
O reconhecimento do Brasil como potência paralímpica é inegável.
A delegação classificou-se para a participação em 20 modalidades, não garantindo vagas apenas nos disputadíssimos rúgbi em cadeira de rodas e no basquete em cadeira de rodas. Apenas no atletismo, o país, que alcançou o histórico segundo lugar no quadro geral de medalhas no último Mundial em 2019, terá a participação de 84 atletas, dentre os quais, 19 atletas-guia.
O Comitê Paralímpico Brasileiro – CPB tem como metas ser e permanecer como referência global na gestão e no desenvolvido do desporto Paralímpico, para, por meio da promoção do esporte paralímpico da iniciação ao alto rendimento, fomentar a inclusão de pessoas com deficiência.
No Brasil, o esporte paralímpico passou por mudanças significativas nas últimas duas décadas, sempre visando a busca do alto rendimento desportivo e a aplicação da melhor tecnologia. Sem nenhuma dúvida, tal circunstância e o consequente sucesso brasileiro são frutos da boa gestão e governança do Comitê Paralímpico Brasileiro, que estabeleceu como alvo em seu planejamento estratégico a manutenção do time brasileiro dentre as dez principais nações participantes nos Jogos.
Uma notícia importante e diretamente relacionada à profissionalização dos atletas é o anuncio feito pelo CPB sobre a premiação para os Jogos de Tóquio. As bonificações serão realizadas de acordo com as medalhas conquistadas, em faixas diferentes de recompensa para modalidades individuais e coletivas. Os medalhistas de ouro em provas individuais receberão R$160 mil por medalha, enquanto a prata renderá R$64 mil cada e o bronze, R$32 mil. Os títulos paralímpicos em modalidades coletivas, por equipes, revezamentos e em pares (bocha), terá prêmios de R$80 mil por atleta, as pratas, serão bonificadas com R$32 mil e as medalhas de bronze, com R$16 mil. Os demais integrantes das disputas (atletas-guia, calheiros, pilotos e timoneiros) vão receber 20% do valor da maior medalha conquistada por seu atleta e 10% a cada pódio a mais do valor da medalha seguinte[12].
O esporte Paralímpico nasceu e expandiu, conforme mencionado, visando a inserção de pessoas com deficiência no mundo esportivo, acautelando-se de resguardar a paridade entre os competidores. A inclusão nos Jogos Paralímpicos é observada a partir da valorização dos atletas, independentemente do seu biotipo ou deficiência, incorporando corpos que fogem dos padrões e destacando a percepção da potencialidade dos atletas.
Porém, muito além dos discursos de inclusão e de superação, é imprescindível que, não se deixe de reconhecer as particularidades dos atletas paralímpicos, reconhecendo-os como aquilo que são: atletas.
E concluímos, com o mesmo pensamento do multicampeão, ex-atleta e Presidente do CPB, Mizael Conrado: o esporte é resiliência e o que todos desejamos é que atletas e todo o staff paralímpico possam buscar a realização de tudo aquilo que se prepararam ao longo desses cinco anos. Que seja a melhor participação brasileira da história!
* O conteúdo do presente artigo não necessariamente representa a opinião do Instituto Brasileiro de Direito Desportivo, sendo de total responsabilidade do(a) Autor(a) deste texto.
¹Advogado, Mestre em Direito Desportivo pela Universidade de Lérida e INEFC de Barcelona, Membro do Conselho Fiscal do Comitê Paralímpico Brasileiro, Vice-presidente da Federação Paulista de Futebol, Ex-Presidente e Conselheiro do Instituto Brasileiro de Direito Desportivo – IBDD.
²Advogada especializada em Direito Penal Econômico, Direito Desportivo e Compliance. Coordenadora Regional – São Paulo e Membro do Grupo de Estudos do Instituto Brasileiro de Direito Desportivo – IBDD.
³DELBIN, Gustavo. Dia do Atleta Paralímpico e a História do Movimento Paralímpico. Disponível em https://ibdd.com.br/dia-do-atleta-paralimpico-e-a-historia-do-movimento-paralimpico/.
[4] Inicialmente, havia referência à paraplegia, todavia a partir da inclusão de outras deficiências no desporto, passou-se a preponderar a referência a realização de maneira fraterna de Jogos Olímpicos e Paralímpicos.
[5] SENATORE, V. Paraolímpicos do futuro. In: CONDE, A.J.M.; SOUZA SOBRINHO, P.A.; SENATORE, V. Introdução ao movimento paraolímpico: manual de orientação para professores de Educação Física. Brasília: Comitê Paraolímpico Brasileiro.
[6] Disponível em https://www.cpb.org.br/faq.
[7] Disponível em https://www.cpb.org.br/modalidades/46/atletismo.
[8] “Uma das modalidades mais recentes, o Frame Running, conhecido no Brasil como Petra – e que até recentemente era chamada internacionalmente de racerunning … ela é mais uma opção para atletas com paralisia cerebral, que correm em seus próprios pés apoiados em um suporte. Mas e o apelido Petra? Ele é uma homenagem ao mascote homônimo das Paralímpiadas de Barcelona de 1992, que demonstrou uma performance incrível na modalidade. O equipamento parece uma bicicleta, mas não é. Ele conta com suporte para o tronco, assento, guidão e três rodas”. Disponível em http://ande.org.br/modalidades-petra/
[9] Disponível em https://www.cpb.org.br/
[10] Disponível em https://agenciabrasil.ebc.com.br/esportes/noticia/2021-03/corte-alema-adia-veredito-de-acao-de-andre-brasil-por-reclassificacao
[11] Disponível em https://cpb.org.br/noticia/detalhe/3446/jogos-paralimpicos-de-toquio-vao-comecar-saiba-tudo-sobre-delegacao-brasileira.
[12] Disponível em https://cpb.org.br/noticia/detalhe/3459/comite-paralimpico-brasileiro-anuncia-premiacao-para-medalhistas-nos-jogos-paralimpicos-de-toquio
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