Gustavo Lopes Pires de Souza
Esta semana o Estatuto do Torcedor completou 10 anos. Entre erros e acertos, a legislação que protege os direitos do torcedor significou uma mudança de paradigma na visão do torcedor que passou a ser encarado como um consumidor.
E não poderia ser diferente, eis que o torcedor corresponde ao consumidor do espetáculo esportivo e por isso deve ter seus direitos respeitados. Aliás, direitos já consagrados pelo Código de Defesa do Consumidor.
Neste esteio, a grande relevância do Estatuto do Torcedor foi trazer tratamento específico a um consumidor específico. Assim, as questões atinentes aos eventos esportivos foram tratadas de maneira especial.
Na sua origem o Estatuto do Torcedor baseava-se no binômio direitos do torcedor – combate à violência. Posteriormente, em 2010, alterações trouxeram obrigações para as Torcidas Organizadas e a tipificação de crimes contra as relações de consumo dos torcedores.
A referida norma foi um verdadeiro marco na história do desporto brasileiro, especialmente do futebol. Os ingressos (bilhetes) e assentos passaram a ser numerados e os torcedores a ter o direito ao seguro por danos sofridos no evento esportivo.
As competições passaram a ser transparentes, instituindo-se um Ouvidor para receber críticas, sugestões e observações acerca da tabela e regulamento das competições.
E, pela primeira vez, desde que o Campeonato Brasileiro de Futebol passou a ser disputado em 1971,, a competição de 2003 teve o sistema de “pontos corridos”, onde a equipe que, após os dois turnos, marcasse o maior número de pontos seria declarada campeã.
A entidade responsável pela organização da competição, bem como a entidade de prática desportiva detentora do mando de jogo, foram equiparadas ao fornecedor, conforme definido no Código de Defesa do Consumidor – CDC. Assim, toda responsabilidade atribuída ao fornecedor pode ser cobrada da entidade organizadora da competição e da entidade de prática desportiva detentora do mando de jogo.
Ato contínuo, os torcedores passaram a ter os mesmos instrumentos processuais que os consumidores para defesa em juízo, notadamente a legitimidade do Ministério Público para a promoção de ações coletivas.
Um aspecto moralizador que deve ser destacado é a obrigatoriedade da escolha dos árbitros por meio de sorteio público, garantindo-se a transparência.
Não obstante isso, apesar dos consideráveis avanços, ainda há muito o que ser implementado a fim de que o torcedor brasileiro seja, de fato, respeitado.
Entretanto, para que os direitos do torcedor sejam realmente respeitados e aplicados, indispensável que o próprio cidadão confira legitimidade à legislação, pleiteando o cumprimento da lei sempre que se sentir lesado.
Ademais, com a profissionalização crescente do esporte e, especialmente, do futebol, torna-se necessário que os clube passem a enxergar a atenção e o respeito aos direitos do torcedor como investimento no seu mercado financeiro com a viabilidade de retorno financeiro e desportivo.
É triste identificar que após dez anos o Estatuto do Torcedor ainda engatinha. Por outro lado, é o momento de se buscar uma reflexão a fim de se incluir a atenção ao consumidor do evento esportivo como prioridade, especialmente no momento em que o país prepara-se para organizar os dois maiores eventos esportivos do mundo.