Edio Leitão
É importante conscientizarmos de que em todo evento esportivo o torcedor se apresenta como figura de importância ímpar, principalmente quando todo o trabalho de gestão e marketing estão direcionados a ele, e nem poderia ser diferente já que é o principal consumidor do produto chamado esporte.
Não somente diante da importância com que o torcedor apresenta, mas também como uma forma de moralizar o esporte, em especial o futebol, veio a lume a Lei nº 10.671/03 conhecida como o Estatuto do Torcedor com aplicação limitada ao desporto profissional, buscando a proteção efetiva do torcedor no mesmo espírito em que o consumidor é protegido pelo Código de Defesa do Consumidor.
E como se não bastasse, para todos os efeitos legais, o Estatuto do Torcedor equipara a fornecedor, nos termos do Código de Defesa do Consumidor, a entidade responsável pela organização da competição, bem como a entidade de prática desportiva detentora do mando de jogo.
Outrossim, impende destacar que o Estatuto do Torcedor se aplica a toda modalidade esportiva, inclusive ao automobilismo, tanto que no GP de Fórmula 1 realizado no Brasil no ano de 2006, a Prefeitura de São Paulo, a São Paulo Turismo e a Interpro, organizadora do evento, assinaram um termo de ajustamento de conduta – espécie de acordo – cujo compromisso era numerar os assentos e correspondentes ingressos a serem vendidos, cumprindo assim, com determinação do referido Estatuto.[fusion_builder_container hundred_percent=”yes” overflow=”visible”][fusion_builder_row][fusion_builder_column type=”1_1″ background_position=”left top” background_color=”” border_size=”” border_color=”” border_style=”solid” spacing=”yes” background_image=”” background_repeat=”no-repeat” padding=”” margin_top=”0px” margin_bottom=”0px” class=”” id=”” animation_type=”” animation_speed=”0.3″ animation_direction=”left” hide_on_mobile=”no” center_content=”no” min_height=”none”][1]
Com efeito, para a categoria de torcedores que efetivamente compram o ingresso para assistirem a um evento esportivo, é assegurado uma gama de direitos dentre eles, o direito a sanitários em número compatível com sua capacidade de público em plenas condições de limpeza e funcionamento; higiene e qualidade das instalações físicas dos estádios dentre outros.
O torcedor/consumidor também tem o direito de que os produtos alimentícios vendidos no local da competição atendam as plenas condições de higiene exigidas pelos órgãos da vigilância sanitária, sendo também vedado impor preços excessivos ou aumentar sem justa causa os preços dos produtos alimentícios comercializados no local de realização do evento esportivo.
Nesse passo, vamos imaginar que durante todo um campeonato tenha sido praticado no estádio determinado preço, por exemplo, com relação à pipoca, mas na partida final esse preço aumenta consideravelmente, em claro oportunismo do comerciante.[2]
Sem dúvida que esse aumento é abusivo e dificilmente o comerciante conseguirá demonstrar uma justa causa plausível para essa postura.
Ocorre que em alguns eventos esportivos, infelizmente o Estatuto do Torcedor não vem sendo respeitado.
Por meio do site www.telaonosetorg.com.br vislumbramos que os torcedores estão enfrentando uma série de dificuldades nas provas do GP Brasil de Fórmula 1, sendo que das várias reclamações verificamos banheiros inadequados e alimentação com preços abusivos e de qualidade duvidosa.
Segundo informações obtidas de quem já esteve no autódromo de Interlagos, há setores em que os torcedores são submetidos à lamentável situação de não terem água para lavar as mãos após o uso dos sanitários, sem contar que os preços dos alimentos são absolutamente abusivos, chegando-se ao cúmulo de se cobrar R$ 5,00 por um copo de água de 300ml, um espetinho de carne ou uma lata de refrigerante, cuja marca não é a das melhores.
Ora, é flagrante o desrespeito ao Estatuto do Torcedor, principalmente na questão dos preços abusivos dos alimentos, pois o que justifica tais produtos serem vendidos a esses preços?
Note-se que conforme artigo 170 da Constituição Federal, vivemos sob a égide de uma economia de livre mercado e livre iniciativa econômica, porém, condicionada há princípios que limitam o processo econômico para assegurar a todos uma existência digna, conforme os ditames da justiça social.
Sem contar que essa liberdade econômica deve necessariamente atender ao princípio de defesa do consumidor.
Ora, nenhum direito pode ser utilizado de forma abusiva ou arbitrária, principalmente quando estamos diante de questões que envolvem a política de preços de bens e serviços, tanto que o Supremo Tribunal Federal já se manifestou no seguinte sentido:
“Em face da atual Constituição para conciliar o fundamento da livre iniciativa e do principio da livre concorrência com os da defesa do consumidor e da redução das desigualdades sociais, em conformidade com os ditames da justiça social, pode o Estado, por via legislativa, regular a política de preços de bens e de serviços, abusivo que é o poder econômico que visa ao aumento arbitrário dos lucros.” (ADI 319-QO, Rel. Min, Moreira Alves, julgamento em 3-3-93, Dj de 30-4-93)”
Todo aumento de preço deve vir calcado em justa causa, pois qualquer prática abusiva de aumento de preços é passível de controle pelo Estado, bem como pelo Poder Judiciário, tanto que o Código de Defesa do Consumidor em seu artigo 39, inciso X, descreve que é prática abusiva elevar sem justa causa o preço de produtos e serviços.
Quem pratica o preço no mercado deve inexoravelmente provar a justa causa de seu aumento, já que em favor do consumidor há o direito da inversão do ônus da prova (artigo 6º, VIII do CDC).
Nesse passo, também defendemos uma análise e aplicabilidade paralela do Estatuto do Torcedor e do Código de Defesa do Consumidor às questões envolvendo os torcedores, pois um não exclui o outro, muito pelo contrário, há um sistema integrativo de normas[3], para maximizar a efetiva proteção da parte vulnerável na relação, ou seja, o torcedor/consumidor.
É imperioso que os torcedores tenham a consciência de que a proteção que lhe é conferida pelo Estatuto tem a mesma essência daquela recebida pelo consumidor através do Código de Defesa do Consumidor.
Logo, diante de uma conduta contrária a lei, é perfeitamente possível ações indenizatórias e cominatórias perante o Poder Judiciário, como também as reclamações junto ao PROCON (Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor), sem prejuízo ainda das atribuições do Ministério Público na defesa dos interesses transindividuais dos torcedores/consumidores, que poderá se materializar por meio das ações civis públicas.
Bibliografia:
[1] SOUZA, Gustavo Lopes Pires, ESTATUTO DO TORCEDOR, A Evolução dos Direitos do Consumidor do Esporte (Lei 10.671/2003), 1 ed. Belo Horizonte: alfstudio, 2010. pág. 118.
[2] GOMES, Luiz Flávio; CUNHA, Rogério Sanches; PINTO, Ronaldo Batista; OLIVEIRA, Gustavo Vireia, ESTATUTO DO TORCEDOR COMENTADO, 1ed. São Paulo: Revistas dos Tribunais. 2011, pág. 79
[3]SOUZA, Gustavo Lopes Pires, ESTATUTO DO TORCEDOR, A Evolução dos Direitos do Consumidor do Esporte (Lei 10.671/2003), 1 ed. Belo Horizonte: alfstudio, 2010. pág. 72.
Edio Hentz Leitão. Pós-Graduado em Direito Civil e Processual Civil pela Universidade Gama Filho. Cursando Gestão e Direito Desportivo pela SATeducacional. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Desportivo. Advogado.[/fusion_builder_column][/fusion_builder_row][/fusion_builder_container]