Gustavo Normanton Delbin¹
Membro Filiado ao Instituto Brasileiro de Direito Desportivo (IBDD)
Primeiramente, necessário agradecer o convite do Presidente Leonardo Andreotti e parabenizar o Instituto por mais este importante gol no fomento ao Direito Desportivo: a revitalização da Coluna Jus Desportiva do IBDD, com artigos semanais de um verdadeiro time de craques jurídicos, é a melhor notícia do ano de 2019 para a área.
De minha parte, abordarei nesta minha primeira contribuição à Coluna, um tema que estudo e acompanho há tempos, mas que não vem tendo a devida evolução e aprovação por parte do Poder Público: a venda regular de bebidas alcoólicas, especialmente a cerveja, em estádios e arenas brasileiros.
Deste modo, além de trazer a condição e atual legislação de proibição ou permissão existente em alguns Estados brasileiros, também rebaterei especificamente o atraso do novo Projeto de Lei em trâmite no Senado Federal que tenta proibir o uso e criminalizar a venda de bebidas alcoólicas no interior de Estádios e Arenas desportivas em todo o País.
I – A legislação sobre bebidas alcoólicas nos estádios
Em âmbito federal, não há Lei que trate da proibição de bebidas alcoólicas nos estádios. A Lei Federal nº 10.671/2003, conhecida como Estatuto do Torcedor, poderia ser o diploma normativo a tratar do tema, porém não o fez. Em que pese muitos sustentarem que a venda e consumo de bebidas alcoólicas nos estádios esteja contida no artigo 13-A do Estatuto Torcedor – inclusive o Senador relator do PL – em verdade, o texto do referido dispositivo não cuida da proibição de venda de bebidas alcoólicas nos estádios e arenas esportivas, senão vejamos:
“Art. 13-A. São condições de acesso e permanência do torcedor no recinto esportivo, sem prejuízo de outras condições previstas em lei:
(…) II – não portar objetos, bebidas ou substâncias proibidas ou suscetíveis de gerar ou possibilitar a prática de atos de violência.”
Quisesse o legislador originário proibir a venda de bebidas alcoólicas o teria feito, de maneira clara e direta, no texto legal. Tal impressão se reforça quando se constata que Projeto de Lei que deu origem ao art. 13-A, fruto de uma emenda substitutiva ao PL 451/95, de autoria do Deputado Arlindo Chinaglia, previa em sua redação original a proibição à comercialização de bebidas alcoólicas no interior do recinto em que ocorressem os jogos, “bem como, nas imediações do local, dentro de uma distância de mil (1.000) metros”. E mais, em seu artigo 19 previu como crime, punindo com pena de detenção de seis meses a dois anos (mais multa), a conduta consistente em “servir bebida alcoólica em estádios, ginásios, ou outro recinto no qual se realizem competições esportivas, ou mesmo nas imediações ou em vias de grande trânsito a estes locais, nos dias de jogos ou competição”.
Aliás, a Doutrina especializada sobre Estatuto do Torcedor segue na mesma linha de interpretação do Artigo 13-A, conforme segue:
“b) Bebidas
Vale destacar que a lei em análise, sob nossa compreensão, não proibiu a venda de bebidas alcoólicas nos locais em que se realizarem os eventos esportivos, mas somente o ingresso no recinto esportivo do torcedor, que estiver na posse de bebida. Mas isso como condição de acesso ao local, não implicando concluir, a partir daí, que esteja proibida a venda de álcool nas praças esportivas. Fosse assim, o legislador teria feito expressa menção às bebidas alcoólicas e não simplesmente às bebidas, como constou na redação final da lei.O que se proíbe, portanto, é o acesso e a permanência do torcedor no recinto esportivo que porte bebida suscetível de acarretar um perigo de dano, gerador em potencial de atos de violência. Assim, por exemplo, uma lata ou garrafa de vidro contendo bebida (pouco importando de alcoólica ou não). Daí a razão pela qual nas praças esportivas, bebidas em geral são acondicionadas em copos plásticos, incapazes de utilização com objetivo ofensivo. Aliás, é o que consta do art. 19 das diretrizes de segurança da FIFA.
(…)
Nada impede, por isso, que a matéria seja prevista pela legislação estadual (mas não em meros regulamentos internos de competições.). No estado de São Paulo, por exemplo, a matéria vem tratada na Lei 9.470/96, a proibir, no âmbito estadual, a venda de bebidas alcoólicas “nos estádios de futebol e ginásios de esportes”, na dicção de seu art. 5º, I, bem como num raio de 200 metros de distância das entradas dos estádios de esporte” (art. 6º), nos dias de jogos.” ²
A proibição da venda de bebidas alcoólicas nos estádios paulistas – que, vale mencionar, está sendo discutida na Assembleia Legislativa de São Paulo, mesmo após o veto do Governador ao Projeto de Lei nº 1363/2015, vez que ainda se encontra em pauta para derrubada do veto – decorre da Lei Estadual nº 9.470/1996. Outra Lei Estadual Paulista, publicada para a permissão de venda de bebidas alcoólicas durante a realização da Copa do Mundo de 2014 foi a Lei nº 15.454/2014.
Historicamente, no Brasil, a proibição da venda e o consumo de bebidas alcoólicas nos estádios de futebol, ocorreu de três maneiras: a) Legislações infraconstitucionais, estaduais, expedidas por Assembleias Legislativas dos entes federativos, como fizeram o Estado de São Paulo, por meio da Lei nº 9.470/1996, o Estado do Rio Grande do Sul, pela Lei gaúcha de nº 12.916/2008, o Estado do Pernambuco com a Lei nº 13.748/2009 e o Estado do Rio de Janeiro com a Lei Estadual nº 2.991/1998; b) Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) que vigoraram nos Estados de Minas Gerais, Santa Catarina, Rio Grande do Norte, Paraná e Distrito Federal; e, c) Resolução da Presidência da CBF nº 01/2008, expedida após termo de adendo realizado junto ao Protocolo de Intenções celebrado com o Conselho Nacional dos Procuradores Gerais do Ministério Público dos Estados e da União.
Deste modo, com exceção das Leis Estaduais que ainda estão vigentes, as demais normas não se prestam a proibir a venda e o consumo de bebidas nos estádios de futebol, haja vista a competência legislativa prevista na Constituição Federal.
Saliento, por fim, que nos Estados em que o consumo de bebidas está liberado existem leis estaduais que permitem o consumo, como é o exemplo do Espírito Santo (Lei Estadual nº 10.309/2014); Paraná (Lei Estadual nº 19.128/2017); Rio de Janeiro (Lei Estadual nº 7.083/2015); Bahia (Lei Estadual nº 12.959/2014); Minas Gerais (Lei Estadual nº 21.737/2015); Pernambuco (Lei Estadual nº 15.709/2016); Mato Grosso (Lei Estadual nº 10.524/2017); Santa Catarina (Lei Estadual nº 17.477/2018) e Ceará (Lei Estadual nº 16.873/2019).
II – O equivocado Projeto de Lei 3788/2019 do Senado
O Projeto de Lei referido está tramitando no Senado Federal e foi aprovado no último dia 12/11/2019 em Reunião da Comissão de Educação, Cultura e Esportes. O próximo andamento previsto é a análise da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (Secretaria de Apoio à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania) do Senado Federal.
Diante do andamento, reproduzo abaixo o inteiro teor da alteração do Estatuto do Torcedor, mais precisamente dos artigos 13-A, 41- B e 41-H, com a alegação de que o abuso da bebida alcoólica é responsável pela violência praticada pelos torcedores nos Estádios e Arenas desportivas, procederemos à análise de seus principais fundamentos demonstrando que o Projeto em questão não possui qualquer fundamento jurídico para sua aprovação:
“Art. 1º- Os arts. 13-A e 41-B da Lei nº 10.671, de 15 de maio de 2003, passam a vigorar com a seguinte redação:
Art. 13-A…
II -Não portar ou fazer uso de objetos, bebidas alcoólicas sou substâncias proibidas ou suscetíveis de gerar ou possibilitar a prática de atos de violência;
Art. 41-B
Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.
§2º – Na sentença penal condenatória, o juiz converterá a pena de reclusão em pena impeditiva de comparecimento às proximidades do estádio, bem como a qualquer local em que se realize evento esportivo, pelo prazo de 1 (um) a 3 (três) anos, de acordo com a gravidade da conduta, na hipótese de o agente ser primário, ter bons antecedentes e não ter sido punido anteriormente pela prática de condutas previstas neste artigo;
§6º A pena prevista neste artigo será aumentada de um terço, caso o agente esteja sob a influência de álcool ou dequalquer outra substância psicoativa que determine dependência.
Art. 2º A Lei nº 10.671, de 15 de maio de 2003, passa a vigorar acrescida do seguinte art. 41-H:
CAPÍTULO XI-A
DOS CRIMES
Art. 41-H. Oferecer, vender, expor à venda, ter em depósito para vender, distribuir ou, de qualquer forma, entregar a consumobebida alcoólica no interior de estádios esportivos.
Pena -reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, multa e impedimento de comparecimento às proximidades do estádio, bem como a qualquer local em que se realize evento esportivo, por2 (dois) a 4(quatro) anos.
Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação”
Na justificativa do PL existe alegação de inconstitucionalidade das Leis Estaduais que versem sobre venda de bebidas alcoólicas nos estádios e arenas desportivas. Este argumento carece de supedâneo jurídico. Vale mencionar que o próprio senhor senador, autor do Projeto de Lei, evidencia a presença de ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas pela Procuradoria Geral da República sobre o tema em questão.
Ora, se existem Ações Diretas de Inconstitucionalidade visando estabelecer a correta interpretação sobre a proibição ou liberação da venda de bebidas alcoólicas em estádios de futebol e arenas desportivas, não é de competência do Poder Legislativo deliberar sobre a interpretação de normas jurídicas, de forma que este projeto de Lei se torna uma afronta direta a teoria da tripartição dos Poderes consolidada por nossa Constituição Federal de 1988. Entendo neste sentido que, diante das ações existentes, cabe ao Poder Judiciário deliberar e julgar o tema em questão.
Ademais, enquanto tais ações não forem julgadas pelo Supremo Tribunal Federal, as leis que permitem a venda de bebidas alcoólicas nas arenas desportivas de outros Estados devem ser consideradas constitucionais, não o contrário. Vale dizer que em três das cinco sedes da recém-finalizada Copa América de Futebol no Brasil foram vendidas bebidas alcoólicas nos estádios, sem que para tanto tenha sido editada qualquer lei federal ou lei estadual específica visando “afastar a aplicação do Estatuto do Torcedor” como quis defender a justificativa do PL.
Ainda na Justificativa do PL atribui-se ao artigo 13-A uma proibição à venda e consumo de bebidas alcoólicas, que como já salientado, não existe. Neste ponto, o máximo que se pode verificar é que o Estatuto traz norma em branco ou mais precisamente, uma norma aberta ou de conceito jurídico aberto. De pesquisa realizada para os pareceres da Comissão Jurídica da Federação Paulista de Futebol sobre o tema, vemos que norma aberta é aquela que apresenta definição ampla, que permite realizar interpretação de grande amplitude e ao julgador permite utilizar-se da mesma em diversas situações, com acepções diferentes. Esta modalidade de norma depende de lei posterior, uma vez que se trata de dispositivo que não tem aplicabilidade em si mesmo, mas está vinculado a outro que traga sua definição ou regulamentação.
O conceito jurídico indeterminado também possibilita interpretação ampla, porém não depende da edição posterior de outra norma. Trata-se de instituto de grande amplitude, ou de fluidez, como caracterizado por Bandeira de Mello³. Já nas palavras de Frederico do Valle Abreu[fusion_builder_container hundred_percent=”yes” overflow=”visible”][fusion_builder_row][fusion_builder_column type=”1_1″ background_position=”left top” background_color=”” border_size=”” border_color=”” border_style=”solid” spacing=”yes” background_image=”” background_repeat=”no-repeat” padding=”” margin_top=”0px” margin_bottom=”0px” class=”” id=”” animation_type=”” animation_speed=”0.3″ animation_direction=”left” hide_on_mobile=”no” center_content=”no” min_height=”none”][4] a expressão “conceito jurídico aberto” é entendida como “a vaguidade semântica existente em certa norma com a finalidade de que ela, a norma, permaneça, ao ser aplicada, sempre atual e correspondente aos anseios da sociedade nos vários momentos históricos em que a lei é interpretada e aplicada” (grifo proposital).
Na obra “Diretrizes Teóricas do Novo Código Civil”, Judith Martins-Costa[5] descreve os “conceitos jurídicos indeterminados” como aqueles “cujos termos têm significados intencionalmente vagos e abertos”.
Desta forma, diante desses conceitos, temos que a norma do artigo 13-A é estruturada de maneira propositadamente “vaga”, permitindo o surgimento de novas normas advindas da relação destes conceitos indeterminados com “princípios, diretrizes e máximas de conduta”. São institutos, segundo os doutrinadores, de grande abertura semântica, a fim de possibilitar sua constante atualização de acordo com a vontade momentânea da sociedade.
Assim, se a bebida alcoólica é “suscetível de gerar ou possibilitar a prática de atos de violência”, tal definição não está contida no Estatuto do Torcedor.
Segundo a justificativa determinada por este Projeto de Lei, a Política Nacional do Álcool, Decreto Federal nº 6.117/2007, visa promover o acesso da população a alternativas culturais e de lazer que possam constituir alternativas de estilo de vida que não considerem o consumo do álcool, bem como, acolhe a conclusão de que existe vínculo entre a intoxicação ocasional por álcool e a violência, e por isso referido documento estaria de acordo com a redação do artigo 13 – A, II do Estatuto do Torcedor.
Cumpre ressaltar, entretanto que a Justificativa do Projeto de Lei partiu de premissa equivocada e inexistente. Isso porque a Política Nacional do Álcool não acolhe a conclusão de que existe vínculo entre a intoxicação ocasional por álcool e a violência, não havendo qualquer conclusão neste sentido[6].
Esta premissa de que o consumo de álcool em eventos esportivos aumente a violência também não está presente nos estudos mencionados no “Consenso brasileiro sobre políticas públicas do álcool”[7] tal qual o artigo de Cahalan, D, & Room, R, 1974, Problemdrinkingamong American men,Psicataway, NJ, US: Rutgers Center of Alcohol Studies, que se trata de uma pesquisa americana – que considerou apenas os indivíduos e a situação local – na qual conclui-se que, muito embora o alcoolismo (e não o consumo isolado em si) acarrete em problemas de impulsividade, tolerância ao desvio e alienação, os fatores ambientais predominam entre os problemas correlatos da bebida, não havendo qualquer conclusão expressa no sentido de que há efetiva correlação entre a intoxicação ocasional por álcool e a violência, razão pela qual tem-se inúmeros casos de intoxicação por álcool que não culminam em atos de violência. Pode-se notar, de outro lado, que o mencionado estudo norte americano – feito, portanto, fora do território brasileiro e sem respeitar as peculiaridades locais, culturais e sociais do país – além de não apontar correlação entre intoxicação ocasional e violência, tampouco considerou o teor alcoólico das bebidas e a frequência de seu consumo[8].
Deste modo, importante concluir que os fatores ambientais (condição financeira e social, núcleo familiar, educação, cultura etc.) predominam sobre os problemas relacionados apenas ao consumo de álcool em se tratando de violência. Forçoso também concluir neste aspecto que a Justificativa quer levar à equivocada premissa de que existe vínculo entre a intoxicação ocasional por bebida alcoólica e a violência.
Assim, a meu ver, a justificativa do PL não traz embasamento técnico-científico apto a comprovar que a bebida alcoólica, por si só e sem qualquer menção à gradação ou quantidade consumida, acarrete suscetibilidade ou possibilidade de ampliação da prática de atos de violência.
III–Conclusão
Estudos comprovam que a liberação da venda de bebidas alcoólicas noutros países ou em Estados brasileiros não ocasionou o aumento da violência. Segundo o doutrinador Gustavo Lopes Souza[9], em artigo publicado em 17 de novembro de 2019 “a atual proibição da venda de cerveja é fruto da interpretação equivocada de dispositivo do Estatuto do Torcedor, que estabelece a proibição do torcedor nos estádios portando objeto ou substância que cause violência. Assim, de inexistir qualquer proibição para a sua venda, não há qualquer estudo que comprove que a cerveja cause violência. Pelo contrário, estudo realizado na Inglaterra (PEARSON & SALE “‘OntheLash’: revisitingtheeffectivenessofalcoholcontrolsat football matches” in: Policing& Society, Vol. 21, No. 2, June 2011) aponta sérios problemas causados pela proibição:
– Os torcedores aumentam a quantidade ingerida de bebida antes de entrar no estádio e passam a ingerir bebidas mais fortes;
– Os torcedores entram no estádio em cima da hora do jogo, dificultando o esquema de segurança e gerando tumulto;
– Os torcedores se concentram nos bares arredores, aumentando a chance de encontro entre torcidas rivais, em espaços sem esquemas de segurança;
– Há grande concentração de público na entrada em cima da hora do jogo, gerando: aumento de filas; aumento de catracas utilizadas; aumento de custos; aumento de tumulto e violência no acesso ao estádio;
– Estádio perde receita (restaurantes, lojas, eventos antes do jogo…);
– Torcedor consome ainda mais bebida, com maior velocidade, inclusive bebidas quentes, sabendo que a bebida é proibida dentro do estádio”.(Grifo proposital)
Ao se analisar a questão, deve-se entender socialmente a ligação entre futebol e cerveja. Trata-se de situação cultural natural, tão lógica, que dificilmente se encontra argumento contrário. Creio que somente o espanto causado pela notícia do Senado Federal tratar da proibição do consumo de cerveja em estádios no Brasil por conta de violência seja maior.
Neste aspecto e trazendo apenas um exemplo de evento desportivo local muito importante, de grande relevância para o comércio, o turismo e a economia do Estado de São Paulo na última semana: a corrida de Fórmula 1 em São Paulo, tem como nome oficial “FÓRMULA 1 HEINEKEN – GRANDE PRÊMIO DO BRASIL”. Um dos maiores eventos esportivos internacionais da Cidade de São Paulo tem cerveja até no nome e, evidentemente, teve ZERO violência!
E para dar exemplos de outros lugares, na Europa, a cervejaria Heineken renovou com a Uefa para patrocinar a Champions League, principal torneio entre clubes de futebol do mundo, por mais três anos e ainda adicionou cota de patrocínio à Euro 2020[10], o torneio continental de seleções.
Por fim, em tempo de futebol como negócio e entretenimento, os clubes não podem abdicar das receitas oriundas da venda das bebidas alcoólicas e, principalmente, do incremento de parcerias e patrocínios com as empresas do setor.
Desta forma, não existe qualquer fundamento fático ou jurídico que sustente a argumentação principal do Projeto de Lei, qual seja, sobre suposta inconstitucionalidade das leis estaduais que permitem o consumo e comercialização nem de que a ingestão de bebidas alcoólicas sejam responsáveis pela violência praticada por torcedores em estádios ou arenas desportivas.
Por todo o exposto, entendo que o Projeto de Lei nº 3.788/2019, deva ser reprovado perante a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal, uma vez que seus argumentos partem de premissas equivocadas e carecem de supedâneo jurídico. Enquanto não houver pronunciamento do Poder Judiciário em sentido contrário, as leis estaduais que autorizam a comercialização de bebidas alcoólicas nos estádios são absolutamente constitucionais.
Em tempo, agradeço à Comissão Jurídica da Federação Paulista de Futebol pelos constantes debates e à minha equipe (Gabriel Bellon, Soraia Fernandes e Matheus Laupman Nascimento) pelo apoio nas pesquisas relacionadas com o tema.
¹ Advogado, Mestre em Direito Desportivo pelo INEFC Barcelona e Universidade de Lérida, Vice-Presidente de Registros, Transferências, Filiação e Licenciamento da Federação Paulista de Futebol, Presidente do Conselho Fiscal do Comitê Paralímpico Brasileiro, Membro da Academia Nacional de Direito Desportivo, da Comissão de Direito Desportivo da OAB São Paulo, Coordenador da Revista Brasileira de Direito Desportivo.
² GOMES, Luiz Flávio et al. Estatuto do Torcedor comentado – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, pág. 39 e 41.
³ MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Discricionariedade e Controle Jurisdicional. São Paulo: Malheiros, 2007. pág. 29.
[4] ABREU, Frederico do Valle. Conceito jurídico indeterminado, interpretação da lei, processo e suposto poder discricionário do magistrado, inhttps://jus.com.br/artigos/6674/conceito-juridico-indeterminado-interpretacao-da-lei-processo-e-suposto-poder-discricionario-do-magistrado, acesso em 20/11/19, as 15:43.
[5] MARTINSCOSTA, Judith, BRANCO, Gerson L. Carlos. Diretrizes Teóricas do Novo Código Civil Brasileiro. Pt. 1. pág. 117/119.
[6]Decreto Federal 6.117/2007: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6117.htm
[7]“Consenso brasileiro sobre políticas públicas do álcool”: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-44462004000500017&lng=en&nrm=iso&tlng=pt. “Apesar de mais de um século de experimentações políticas com um espectro de opções (diferentes) bastante amplo, ainda muitas vezes o que vêm à mente, quando se fala em políticas do álcool, são as experiências de proibição total que ocorreram em alguns países no início do século passado. EUA, Canadá, Noruega, Islândia, Finlândia e Rússia proibiram a produção e a venda de todas, ou de quase todas, as bebidas alcoólicas a partir de 1914.1 Entre os anos de 1920 e 1930, tais leis foram revogadas e substituídas por políticas regulatórias mais brandas. Mas enxergar as políticas do álcool através da perspectiva restrita da proibição total, entretanto, é negligenciar o fato de que muitas políticas elaboradas durante o século passado incrementaram e respeitaram o direito de beber com moderação. Nos últimos 30 anos, a OMS coordenou um projeto que visou analisar todas as evidências disponíveis sobre as políticas públicas em relação ao álcool, que resultou em dois livros fundamentais: Políticas de controle do álcool em uma perspectiva de saúde pública2, e Política do álcool e o bem comum.3 As conclusões foram as seguintes: 1) A pesquisa estabelece, sem margem à dúvida, que existem medidas de eficácia comprovada para reduzir os custos e os danos relacionados ao uso de álcool, visando ao bem comum. 2) É possível desenvolver estratégias que influenciam tanto a quantidade de álcool consumida por uma comunidade quanto os comportamentos de consumo e os contextos de alto risco causadores dos problemas relacionados ao consumo de álcool. Recentemente, dando continuidade à tradição de colaboração entre a OMS e pesquisadores da área, houve o lançamento de um terceiro livro, Alcohol: no ordinary commodity.4 Seus autores o escreveram por três razões: 1) Pesquisas epidemiológicas revelam mudanças na forma como o álcool afeta a saúde e o bem-estar social da população em diferentes regiões do mundo. A população de países em desenvolvimento é atingida de forma crescente e peculiar por problemas relacionados ao consumo do álcool. 2) Governos locais e nacionais têm se responsabilizado de forma crescente por elaborar políticas de saúde apropriadas para combater esses problemas, incluindo programas de prevenção e tratamento. 3) Existem, atualmente, evidências científicas sólidas que fundamentam tais políticas, oferecendo uma oportunidade única aos formuladores de políticas públicas.
[8] Muito importante frisar que nos eventos esportivos nos Estados Unidos, sejam no futebol da MLS, ou no basquete da NBA, ou no beisebol da NLB, no futebol americano da NFL ou em qualquer outra modalidade esportiva, onde os eventos são grandiosos, muito bem produzidos, não há notícia de qualquer ato violente e o consumo de bebidas alcoólicas é totalmente permitido, com patrocínios e ativações de marketing bastante desenvolvidos.
[9] A INSANA PROIBIÇÃO DA CERVEJA NO FUTEBOL (https://leiemcampo.com.br/a-insana-proibicao-da-cerveja-no-futebol/
[10] Máquina do Esporte, acesso em 20 de novembro de 2019, as 16:29, https://maquinadoesporte.uol.com.br/artigo/heineken-renova-champions-com-uefa-e-adiciona-euro-2020_38716.html?fbclid=IwAR1sReTPD_gCTJZwMz9DFdJdGfIJV0RcySWt7DZcC9gxD8Qde_4LlqLkvWY
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