Flagrado em exame antidoping surpresa pré-luta antes do UFC 183, Anderson Silva aguarda a audiência com a Comissão Atlética do Estado de Nevada (NSAC) do próximo dia 17 de fevereiro para iniciar sua defesa. Quando o fizer, vai encarar uma bancada com seus próprios protocolos, e que, apesar de seguir a lista de substâncias proibidas da Agência Mundial Antidoping (Wada), não é signatária do Código Mundial Antidoping da entidade, o que torna o prazo de uma possível punição mais difícil de se prever.
Leonardo Azevedo, especialista em Direito Desportivo e coordenador da área cível do escritório Rayes & Fagundes Advogados Associados, analisou o caso e o histórico da comissão e acredita que, caso Spider seja considerado culpado ao final do processo, não deve pegar mais do que um ano de suspensão mais pagamento de multa sobre o valor de sua bolsa.
– O que a prática nos diz? Nunca vi ninguém pegar mais que entre nove meses a um ano (de suspensão). A multa pode oscilar. Como o caso dele vai ter muita repercussão e o sistema é abstrato, não é transparente, tudo pode mudar. Está nas mãos de uma comissão. Eles podem inovar agora. Acredito que seja difícil pelo próprio histórico dele, final de carreira, interesses do UFC… Tomara que a pressão do doping seja grande. Terem feito trabalho preventivo dia 9, depois de terem pego Jon Jones, já mostra que estão ativos em relação ao doping. Não acho que vão surpreender muito mais que isso. Pode oscilar de um ano ou pouco mais. Eu colocaria no máximo um ano e pouquinho e uma multa – disse Azevedo, que ressaltou que o anúncio do doping de Anderson ainda é uma decisão parcial, já que o exame pode ser derrubado pela contraprova.
De fato, casos semelhantes no UFC não receberam punições maiores que isso. Uma das substâncias que apareceu no exame de Anderson Silva, a drostanolona, foi a mesma que resultou em suspensões para Thiago Tavares em 2013 e para Piotr Hallmann em 2014, ambos em lutas no Brasil. Réus primários, os dois foram suspensos por nove meses.
– As comissões atléticas no mundo inteiro possuem mais ou menos o mesmo protocolo. Pode mudar um pouco a diferenciação de dias, prazos, etc, mas o protocolo é mais ou menos o mesmo, segue a mesma lógica: uma vez que é detectada uma substância proibida, o atleta é notificado; ele tem o direito de recorrer, ele recorre se quiser, e, a partir do recurso dele, ele pode se defender através de qualquer meio lícito, pode participar da contraprova e, ao final, ou se mantém a punição em virtude da questão de análise técnica, ou não se mantém ao mostrar que a (primeira) prova não está correta ou não é conclusiva – afirmou Rafael Favetti, chairman da Comissão Atlética Brasileira de MMA.
O exame preliminar de Anderson Silva apontou também o uso de Androsterona, o que seria um agravante no caso. No ano passado, Chael Sonnen foi flagrado com cinco substâncias proibidas em seu organismo em dois testes diferentes, mas, apesar disso e de ter um histórico prévio de suspensão por falhas no antidoping, o americano foi suspenso por apenas dois anos pela comissão de Nevada. Também lhe foi ordenado que pagasse o valor dos testes a que se submeteu e falhou, e que colaborasse com a NSAC no seu programa antidoping.
– Cada comissão atlética tem sua soberania nesse tipo de julgamento. O que deve ser considerado é uma pena base, depois vêm os agravantes e depois vêm os atenuantes. Logo, não há uma tabela única de punição em relação aos atletas no mundo inteiro e em todos os esportes – explicou Favetti.
Caso o UFC e a NSAC fossem signatários do código da Wada, porém, as repercussões poderiam ser maiores. O novo código da entidade, que entrou em vigor em 1º de janeiro de 2015, prevê punição de até quatro anos para casos como o de Anderson Silva.
– Em 2015 começou a vigorar o novo código, muito mais rígido em relação às penas por doping. Ao mesmo tempo, ficou maleável para casos em que a culpa fosse acidental. O código de 2009 era rígido, mas não dava abertura para discussão. Este te dá abertura, mas, ao mesmo tempo, se provar a má fé, fica mais rígido, te dá quatro anos, e, com a reincidência, até o banimento. Outra mudança é que as pessoas ao redor, que participaram dos treinamentos, todo mundo dentro do processo administrativo que tiver uma participação, será penalizado também. Essa maleabilidade que digo que você consegue atenuar uma pena, por mais rigorosa que ela seja, você também consegue expandir a responsabilidade para outras pessoas – contou Leonardo Azevedo.
A pressão por um esporte limpo de esteroides e “drogas de aumento de performance” cresceu no meio do MMA nos últimos anos, especialmente após o UFC e a comissão de Nevada iniciarem um programa de exames antidoping surpresa fora de período de competição. Desde dezembro de 2013, foram flagrados nesses testes cinco de 16 lutadores cuja participação foi tornada pública. Todavia, atletas como Georges St-Pierre e Ben Askren pedem que as organizações e comissões tornem-se signatárias do Código Mundial Antidoping da Wada, o que significaria um controle mais rígido. Azevedo nota, porém, que os custos disso também seriam maiores para o Ultimate.
– Vários atletas questionam a transparência do processo de doping do UFC, porque as penas sempre se limitam a um ano com acréscimo de multa. Eles falam que não, que estão rigorosos, fazem trabalho preventivo. O UFC é um evento. Muita gente atrela ao esporte, que tem que ser auditado pela Wada. Como faz para ser signatário? Tem vários pré-requisitos, tem que conseguir selos de várias federações, provar esses pré-requisitos, é caro. Para o negócio, às vezes não é tão bom de custo imediato, mas, para a credibilidade do evento para o público, é bom, porque é atrelado ao esporte – explicou.
Fonte: SporTV