Estudo ligado ao Unicef aponta riscos na formação de atletas de futebol

Vulnerabilidades no início da carreira ocorridas em clubes do País são abordadas em pesquisa

O sonho é comum a milhares de crianças brasileiras: passar pelas “peneiras” e entrar em um clube para, no futuro, jogar futebol profissionalmente. Com isso, ter a chance de viver do esporte e transformar a vida dos familiares. As histórias de sucesso, contudo, encondem a realidade. No País do futebol, os direitos da criança nem sempre estão garantidos.

Com base nisso, o Unicef, em parceria com o Cedeca (Centro de Defesa da Criança e do Adolescente Yves de Roussan) e a Secopa/Bahia, lança nesta terça-feira, em Salvador, na Fonte Nova, a publicação “A infância entra em campo – riscos e oportunidades para crianças e adolescentes no futebol”. O estudo analisou as condições de meninos e meninas após realizar mais de 40 entrevistas com crianças e suas respectivas famílias, além de técnicos, ex-atletas e dirigentes. O estudo foi realizado na Bahia e contou com o apoio de clubes do estado.

O resultado é preocupante, pois muitos direitos se perdem à medida que o processo de profissionalização ocorre. “No País do futebol é natural que as crianças queiram (se tornar jogadores). Mas é preciso que o momento seja oportuno. E que não haja abdicação de nada. Todos os direitos precisam vir juntos”, disse Fabiana Gorenstein, oficial da área de proteção do Unicef no Brasil.

De acordo com ela, a carreira de jogador do futebol apresenta “vulnerabilidades”, impedindo a garantia integral de direitos à saúde, à educação, à convivência familiar e comunitária e à integridade física e psicológica. Em alguns casos, por exemplo, a convivência com a família é nula. Dessa forma, algumas crianças ficam até oito meses sem contato com os pais.

“Isso prejudica a formação. Traz prejuízos graves”, ressalta Fabiana. A pesquisa mostra também que os meninos e meninas que frequentam centros de formação de atletas, como clubes e escolinhas privadas de futebol, são expostos a riscos como profissionalização precoce, exploração e abuso sexual e afastamento do ensino regular.

CAUSAS
Fabiana explica que a realidade está ligada, sobretudo, à incompatibilidade entre a Lei Pelé e o  Estatuto da Criança e do Adolescente. Segundo ela, não há harmonia entre eles, no sentido de preservar o direito dos adolescentes que querem ingressar no esporte. “Há um desconhecimento mútuo: o mundo esportivo desconhece a garantia do estatuto. E existe um vácuoi no estatuto. A criança não deixa de ser criança porque ela pratica esporte de alto rendimento”, disse.

A publicação traz, no total, cinco capítulos, além da introdução e da conclusão. Eles abordam, por exemplo, as diferenças entre esporte educacional e esporte de rendimento, além dos números, informações sobre a legislação brasileira e as principais ameaças aos direitos. A iniciativa de trazer à tona a realidade brasileira nas categorias de base está ligada também ao momento esportivo que o Brasil vive, pois a Copa do Mundo e aOlimpíada ampliam o sonho das crianças e adolscentes. Além disso, histórias de desrespeito aos direitos nos últimos anos têm se tornado fatos recorrentes.

“O diálogo está só no começo. É preciso compatibilizar esses dois mundos, mudar a mentalidade e instaurar na sociedade outra concepção. Garantir direito ao esporte seguro e protegido”, conclui Fabiana.

O debate em Salvador contará com a presença de João Paulo Medina, preparador físico e criador da Universidade do Futebol, Murillo José Digiácomo, promotor de Justiça, Antônio Jorge Gonçalves Soares, professor da UFRJ, Emanuel Macedo de Medeiros, membro do Conselho Consultivo International Centre for Sport Security (ICSS) e Emerson Ferreti, dirigente do Esporte Clube Ypiranga. O evento terá início às 8h30 e será aberto ao público.

 

Fonte: Estado de São Paulo

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