Igor Gabriel Krüger Poteriko¹
Membro Filiado ao Instituto Brasileiro de Direito Desportivo – IBDD.
Passamos por períodos turbulentos nos bastidores do futebol, a paralisação de campeonatos; o retorno; jogos de campeonatos estaduais sendo organizados em outros estados; etc. E no momento em que o assunto da vez, a Superliga Europeia parece ter chegado ao fim, um escândalo grave e muito mais próximo da gente está explodindo.
Na Quinta-feira passada, 22 de abril, a Federação Paranaense de Futebol afastou os atletas Enzzo; Castro; Gabriel Oliveira e Lapa, do Cascavel C.R. por suspeita de uma tentativa de falsificação do exame RT-PCR. Além dos quatro atletas, quatro membros da comissão técnica e seis integrantes da diretoria do clube também foram retirados do estádio por representantes da FPF antes do início da partida².
O teste ao qual se refere o ocorrido tem como objetivo detectar a covid-19, previsto no Protocolo de Jogo da FPF/COVID -19. A situação ocorreu antes da partida contra o Athletico Paranaense, válida pela 4ª Rodada do Campeonato Paranaense de Futebol.
A Federação Paranaense de Futebol declarou em Nota Oficial que encontraram “indícios de falsificação” e que o laboratório foi acionado, tendo a biomédica Dra. Rosângela Aparecida Silveira, então dona do laboratório EXAME da cidade de União da Vitória/PR, afirmado que nenhum dos jogadores citados haviam passado pelo exame perante o laboratório em questão.
Segundo notícias, a proprietária do laboratório disse que foi surpreendida, quando a Federação entrou em contato com ela por e-mail, com 14 (quatorze) pessoas relacionadas, questionando se essas pessoas tinham feito testes na terça-feira. E que ao conferir, em um arquivo que a mesma leva junto para todas as testagens, com uma lista relacionada, teria constatado que as 14 (quatorze) pessoas não foram efetivamente testadas, a Federação então enviou cópia dos laudos e destas conferências obteve-se o indício de falsificação por parte da Agremiação quanto aos 14 laudos de exames. ³
O caso será analisado pelo Tribunal de Justiça Desportiva do Paraná (TJD-PR), diante da suposta quebra do protocolo assinado pelos 12 (doze) clubes que disputam o campeonato. Pois no Capítulo 6 do Protocolo em referência, “TESTAGEM E CONTROLE”, mais especificamente na Alínea G – Os clubes deverão realizar a cada jogo o exame tipo molecular RT- PCR ou pesquisa antígeno viral por fluorescência ou pesquisa antígeno viral por imunocromatografia ou Pesquisa de Antígeno–SWAB Rápido de toda delegação (comissão técnica, atletas, equipe de apoio, staff operacional de vestiário e diretores).
Fora noticiado ainda que, após o episódio toda a comissão técnica do Cascavel C.R. teria pedido demissão.
A FPF na sua nota afirmou que repudia toda e qualquer tentativa de fraude e violação ao Protocolo de Jogo da FPF/COVID-19, bem como que os fatos serão reportados ao Tribunal de Justiça Desportiva do Paraná (TJD/PR) para apuração, e aplicação das penalidades cabíveis.
Vale ressaltar que não é a primeira vez que há escândalos sobre a temática de fraudes em testes para a covid-19. De acordo com a investigação do Tribunal de Justiça Desportiva do Rio de Janeiro (TJD-RJ), supostamente o Mesquita Futebol Clube teria falsificado 57 testes de Covid-19 durante a disputa da Série B2 do Campeonato Carioca de 2021, concluído em fevereiro. O caso teria sido denunciado pelo próprio Presidente Sr. Ângelo Benachio, e após investigação da Procuradoria do TJD-RJ, o clube e os dirigentes foram citados por falsificação de documentos e conduta antiética desportiva.[fusion_builder_container hundred_percent=”yes” overflow=”visible”][fusion_builder_row][fusion_builder_column type=”1_1″ background_position=”left top” background_color=”” border_size=”” border_color=”” border_style=”solid” spacing=”yes” background_image=”” background_repeat=”no-repeat” padding=”” margin_top=”0px” margin_bottom=”0px” class=”” id=”” animation_type=”” animation_speed=”0.3″ animation_direction=”left” hide_on_mobile=”no” center_content=”no” min_height=”none”][4]
Segundo a reportagem, o Clube foi condenado pela 7ª Comissão Disciplinar do Tribunal de Justiça Desportiva do Rio de Janeiro (TJD-RJ), onde responderam ao processo também o ex-presidente Sr. Cleber Louzada, o atual Sr. Ângelo Benachio e o gestor Sr. Antônio Carlos Dias de Souza. Por responsabilização das falsificações então denunciadas.
Os casos vêm à tona enquanto as Federações buscam trazer soluções para o futebol e comprovar que seus protocolos são seguros, para que não seja necessário mais paralisações de seus campeonatos. Pois sem eles todo o funcionamento de um setor enorme como o futebol, que gera emprego para milhares de pessoas, ficaria extremamente comprometido e sem previsão de retorno, o que traria prejuízos incalculáveis às federações, aos clubes e também aos investidores do espetáculo.
Quando nos deparamos com escândalos como os exemplificados acima, temos que analisar o quão grave são as suspeitas pois, uma falsificação de teste é muito mais que apenas burlar o protocolo de segurança de uma liga, mas “remar contra” todo o trabalho das federações e os investimentos para que sejam encontradas alternativas seguras de continuar as atividades. Ademais, é colocar em risco a integridade física dos atletas; das comissões técnicas, próprios e demais inseridos nas respectivas competições, além de riscos aos árbitros, e familiares de todas as pessoas envolvidas com o futebol profissional.
A covid-19 além do impacto econômico gigante não só no futebol, provocou uma crise sanitária que perdura desde Março de 2020 fazendo, apenas em nosso país (Brasil), mais de 400 (quatrocentas) mil vítimas fatais.
Para que possamos conciliar as atividades econômicas (dentre elas o futebol) e o controle do vírus, vez que ambos são de extrema necessidade, devemos elaborar e nos atentar aos protocolos de medidas de segurança, que devem ser seguidos de forma rigorosa, para que possamos estar o menos expostos possível nas nossas atividades cotidianas e assim oferecer segurança aos demais também. Em razão de que, a economia é uma engrenagem, embora hoje tenhamos o dinheiro (moeda) para obtermos melhor controle da economia, ela nunca deixou de ser baseada na troca, giro.
Sendo assim, se uma peça dessa engrenagem paralisa, as outras não irão funcionar corretamente, por isso o meio insalubre que estamos vivendo é também extremamente prejudicial à economia e responsável por essa crise que inevitavelmente atinge os clubes e entidades de administração do desporto.
Os exemplos de casos mencionados no presente artigo, em tese, enquadram-se em dois artigos do CBJD. Vejamos:
Artigo 234 – “Falsificar, no todo ou em parte, documento público ou particular, omitir declaração que nele deveria constar, inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que deveria ser escrita, para o fim de usá-lo perante a Justiça Desportiva ou entidade desportiva.
PENA: suspensão de cento e oitenta a setecentos e vinte dias, multa de R$ 100,00 (cem reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais) e eliminação na reincidência; se a infração for cometida por qualquer das pessoas naturais elencadas no art. 1º, § 1º, VI, a suspensão mínima será de trezentos e sessenta dias.
§ 1º Nas mesmas penas incorrerá quem fizer uso do documento falsificado na forma deste artigo, conhecendo-lhe a falsidade.
§ 2º No caso de falsidade de documento público, após o trânsito em julgado da decisão que a reconhecer, o Presidente do órgão judicante encaminhará ao Ministério Público os elementos necessários à apuração da responsabilidade criminal.”
Artigo 258 – “Assumir qualquer conduta contrária à disciplina ou à ética desportiva não tipificada pelas demais regras deste Código.
PENA: suspensão de uma a seis partidas, provas ou equivalentes, se praticada por atleta, mesmo se suplente, treinador, médico ou membro da comissão técnica, e suspensão pelo prazo de quinze a cento e oitenta dias, se praticada por qualquer outra pessoa natural submetida a este Código.”[5]
Com base nos pontos explanados, deve ou pelo menos há como se entender que o problema das fraudes nos testes RT-PCR praticados no meio do esporte não são apenas de interesse da Justiça Desportiva, mas também de interesse social, em razão de que pessoas alheias a esfera esportiva podem ser lesadas ou até terem suas vidas interrompidas por atitudes de alguns dirigentes.
Ou seja, para o bem das competições, respeitando os princípios elencados no artigo 2º do CBJD da ampla defesa (inc. I); contraditório (inc. III) e o devido processo legal (inc. XV), caso sejam reconhecidas e comprovadas fraudes, como caráter pedagógico, além de penalizar as equipes, por se tratar de uma prática coletiva e quiçá reiterada, os responsáveis devem ser denunciados ao Ministério Público para que respondam na esfera criminal, como previsto no § 2º do já citado artigo 234 do CBJD.
Pois fraudar exame para detecção da covid-19, assim como qualquer falsificação de documento público ou particular é crime previsto na legislação brasileira no Código Penal nos artigos 297; 298; 299 e 302.
Além dos crimes por falsificação de documento, levando em consideração a especificidade da matéria sobre a qual os mencionados documentos fazem referência, há que ser considerado também o enquadramento no artigo 132 – Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente, por se tratar de uma doença que pode trazer danos físicos e a vida dos envolvidos nas realizações das partidas, e ainda o artigo 268 que estabelece quanto a “Infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa”[6]. Pois as competições dependem da aprovação do poder público para serem realizadas, e os protocolos são requisitos essenciais para a obtenção da autorização, logo, conclui-se que a quebra de protocolo neste aspecto, configura infringir determinação do poder público.
Por fim ressalta-se que as atitudes tomadas pelos dirigentes que efetivamente praticam as ditas “fraudes em testes de COVID”, vão na contramão dos propósitos do esporte e do fair play, comprometendo diretamente a lisura das competições, acarretando danos às imagens das Federações, abrindo precedentes para que a segurança dos protocolos sejam relativizadas, e podendo ainda propiciar diversos problemas posteriores, como aumento do surto de covid, inclusive dentro das competições, novas paralisações, e o incremento da eterna corrida contra o tempo para estar sempre atualizando e apresentando novos protocolos, com novas soluções com a finalidade de vedar as supostas fraudes.
* O conteúdo do presente artigo não necessariamente representa a opinião do Instituto Brasileiro de Direito Desportivo, sendo de total responsabilidade do Autor deste texto.
¹ Acadêmico do 9º período de Direito da Faculdade UCP – Paraná, pesquisador do GEDD-USJT e GEDD FAAP, Membro Filiado ao IBDD.
² Jogadores são afastados após suspeita de fraude em teste de covid no Paraná. Disponível em-https://www.uol.com.br/esporte/futebol/ultimas-noticias/2021/04/22/jogadores-sao-afastados-apos-suspeita-de-fraude-em-teste-de-covid-no-parana.htm. Acessado em 24/04/2021.
³ Laboratório diz que Cascavel CR fraudou pelo menos 14 exames de Covid-19 – Disponível em https://www.umdoisesportes.com.br/athletico/laboratorio-cascavel-cr-fraudou-pelo-menos-14-exames-de-covid-19/. Acessado em 24/04/2021.
[4] Clube carioca e dirigentes são condenados por testes falsos de covid-19 – disponivel em https://www.uol.com.br/esporte/futebol/ultimas-noticias/2021/04/21/clube-carioca-e-dirigentes-sao-condenados-por-testes-falsos-de-covid-19.amp.htm. Acessado em 24/04/2021.
[5] CÓDIGO BRASILEIRO DE JUSTIÇA DESPORTIVA – https://conteudo.cbf.com.br/cdn/201507/20150709151309_0.pdf
[6] BRASIL. Decreto-Lei 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal.
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