Governo apoia ação da Fifa contra os investidores, mas futuro é incerto

A proibição da participação de terceiros nos direitos econômicos dos jogadores de futebol, anunciada pela Fifa, mas ainda em fase de pré-regulamentação, divide opiniões. Em debate sobre o tema no “Arena SporTV” desta segunda-feira, dois presidentes de clubes e um executivo de um fundo de investimento se posicionaram contra o banimento. Já Toninho Nascimento, secretário de futebol do Ministério dos Esportes, acha que os clubes se tornarão muito mais saudáveis financeiramente.

Integrante do Comitê de Estudos da Fifa sobre investidores de futebol, órgão criado pela entidade durante a Copa do Mundo, o advogado Marcos Motta disse que representou os clubes brasileiros na discussão e que era contra o banimento dos terceiros. A posição dele, da Liga Espanhola e de representantes do Porto era de uma nova regulamentação.

– Na última reunião discutimos a regulamentação. Eu era contra o banimento. Na reunião do Comitê Executivo, levaram à votação e resolveram banir. Em breve haverá a discussão sobre a implementação (…). A Uefa vinha pressionando, sempre sendo favorável a essa medida. Sei da importância do investidor. Esse impacto não será só na América do Sul, o Porto opera assim, o Atlético de Madrid tinha mais da metade do time em coparticipação na final da Liga dos Campeões – lembra.

Motta, que defende um período de transição de até cinco anos, acredita que essa pressão da Uefa seja apenas para beneficiar o mercado do Velho Continente, que passou a ter de gastar mais para tirar os bons jogadores do Brasil.

–  Antigamente vinham ao Brasil e com alguns milhões de dólares levavam a promessa. Com investimentos, os clubes mais oxigenados não vendem tão rápido. Vai haver um enfraquecimento dos clubes e uma dificuldade grande em manter os jogadores em seus planteis. Pode acontecer dos nossos jogadores ficarem mais baratos.

GOVERNO ACHA POSITIVO

Secretário de futebol do Ministério dos Esportes, Toninho Nascimento acha que essa situação obrigará os clubes brasileiros a discutirem a organização e torna ainda mais importante a aprovação da Lei da Responsabilidade Fiscal do Esporte, que deve ser votada no Congresso Nacional após o segundo turno das eleições.

– O Ministério do Esporte votaria pelo banimento. Cogitamos aproveitar a LRFE para extinguir a participação dos terceiros, mas não fizemos. A medida será excelente. Estava virando uma feira. Só há investidores porque os clubes estão fracos.

Um dos caminhos sugeridos pelo secretário é o de seu aproveitar esse ambiente de mudanças para rediscutir a Lei Pelé, o que poderia tornar o clube formador mais valorizado.

– Pelo estatuto da Criança e do Adolescente, não se pode ter contrato antes dos 16 anos. Alexandre Gallo nos sugeriu criar uma nova categoria entre o esporte profissional e o esporte da lazer, que hoje existe na Lei Pelé. Seria o esporte de formação, como Alemanha e EUA têm, para poder assinar contrato com 14 anos e treinar melhor os garotos – explica.

– Será que não é hora de tirar o futebol da Lei Pelé, criando uma lei específica de futebol, com legislação trabalhista, de formação? A medida da Fifa vai exigir que a gente sente e converse (…) Aprovada a lei, o futebol tem de ver: o que a gente quer? Ela vai nos ajudar a esquecer os 7 a 1 – completou.

 

CORITIBA VÊ COM DESCONFIANÇA

Vilson Ribeiro, que preside o Coritiba, entende que essa lei vai enfraquecer os clubes de forma imediata porque vai tirar deles a opção de fazer dinheiro rápido, o que acaba sendo importante para o pagamento de folha salarial ou dívidas fiscais e trabalhistas. Hoje, os clubes vendem percentuais econômicos de jovens jogadores em troca de valores à vista.

– Esse ativo (jogadores) tem sido moeda de troca para fluxo de caixa. É uma medida complexa e que tem que ser muito bem avaliada como vai funcionar. Se esse ativo for tirado dos clubes, todos vão ter uma dificuldades enorme. Os clubes vão se adaptar, mas leva um período. E tem as constituições legais, a Constituição Federal protege essa liberdade de investimento. Os contratos assinados são protegidos pela lei maior. Os investidores são grande instrumentos para os clubes pagarem suas obrigações – explica o dirigente.

Apesar de ser favorável à provação da LRFE, o presidente do Coxa afirmou que a aprovação dessa lei não resolverá todos os problemas do futebol brasileiro. E que um fortalecimento dos clubes brasileiros será necessário.

– A Lei Pelé é um problema para os clubes, porque trouxe um passivo trabalhista absurdo (…) Os clubes formadores não conseguem manter suas bases porque não tem condições de estruturar e aproveitar os talentos. Precisa mudá-la para blindar clubes formadores. A LRFE é uma mudança de gerenciamento, é fundamental que se aprove. Agora sobre o banimento dos investidores, é duro. Hoje os clubes pagam absurdo para os atletas, o que tem que se fazer é viver de acordo com sua realidade, todos trabalham com fluxo de caixa negativo. Onde o clube vai buscar para pagar isso?  No investidor, na televisão e na base de sócios. Às vezes se pagam taxas absurdas, e os fundos não cobram as taxas que os bancos cobram, o custo é menor – explicou, mostrando que há sintonia entre clubes e investidores.

Apesar disso, as novas realidades podem ser positivas para os caixas dos clubes:

– Os salários vão cair, treinador não vai ganhar esse absurdo que ganha hoje, e nossos contratos vão vir em novo patamar – projetou.

DIS GARANTE SER UM PARCEIRA DOS CLUBES

Braço esportivo do Grupo Sonda, a DIS é um dos fundos de investimentos mais importantes do país, tendo participado de grandes transações nos últimos anos, tirando Neymar e Paulo Henrique Ganso do Santos e levando a dupla a Barcelona e São Paulo.

– Socorremos direto todos os times. E o investimento que fazemos tornam os times mais fortes, com bilheterias maiores. Saindo nossa participação, vai ser cada vez mais difícil para eles (…).  Nós, empresários, somos parceiros. Temos mais de 100 atletas, e fazemos a vontade deles. Ganso tinha proposta do Grêmio muito maior, dando dinheiro à vista, mas optamos pelo o que atleta queria, ir para o São Paulo (…) Nós colaboramos com a saúde financeira dos times – disse o executivo Roberto Moreno.

Apesar de ainda haver muitas dúvidas sobre como tudo vai funcionar, o executivo já começa a imaginar como poderá ficar o cenário para a DIS, que tem os irmãos Idi e Delcir Sonda como acionistas.

– Podemos fazer o que se na Europa, onde criaram a cessão direito creditório, que é a mesma coisa, mas sem direito econômico. Fazer valer nossos contratos na esfera cível. Ou comprar um time de futebol para ter base e tudo, não ser hospedeiro, e também registar nossos atletas – disse ele, que afirma que, hoje, a DIS é “deficitária”

VITÓRIA QUER O CAPITAL NO FUTEBOL

Profissional do mercado financeiro, o presidente do Vitória, Carlos Falcão, também disse ser contra o banimento dos investidores no futebol.

– A linha que preferia era a da regulamentação, da discussão, acho banimento muito forte. Para o Vitória esse efeito será pequeno, temos pouca participação de investidores nos nosso atletas. Temos em torno de 70% dos atletas. Mas acho que tudo isso vai gerar problemas para os clubes (…) Não posso ser contra o capital. Mas entendo que seria mais saudável ao futebol brasileiro uma regulamentação que protegesse os clubes formadores – destacou.

PROBELMA É O FATIAMENTO ANTES DO PRIMEIRO CONTRATO

Especialista em direito esportivo, Eduardo Carlezzo disse que, na maioria das vezes, o fatiamento dos direitos econômicos dos jogadores acontece ainda antes do primeiro contrato profissional, aos 16 anos.

– Investidores que trazem dinheiro ao clube são muito bem vindos, que vão no clube estrangulado e compram 20 ou 30% de um jogador. Agora eles não são maioria, não passam de 20%. A maior parte da cessão de direitos econômicos acontece no primeiro contrato profissional. Chega o atleta, o pai e um empresário dizendo que só assinam o contrato se der 50% dos direitos. Ocorre com jogadores já formados pelo clube, que precisa ceder. Mesma coisa nas renovações. O agente força e o presidente, cobrado pelo torcedor, cede parte dos direitos. A maior parte das cessões não tem pagamento, é cessão contratual – explica.

Para o advogado, a Fifa dará tempo para que todos os contratos vigentes cheguem ao fim. E, mesmo após a regulamentação, ainda haverá investidores recebendo dinheiro nas vendas futuras por direito adquirido. E, apesar de haver “jeitinho” para tudo no futebol, Carlezzo acredita que não será fácil burlar a nova regulamentação.

– Hoje há maneiras demasiadas de burlar tudo. Agente Fifa não poderia ter direito econômico, mas na prática isso não é aplicado, eles constituem pessoa jurídica e participam. Por lei, nenhum atleta ou clube pode negociar com agente não licenciado, mas isso não acontece. Essa é uma medida dura por esse ambiente em que ninguém respeita nada, mas pelo o que demonstraram, acho que essa será efetiva – afirmou.

Fonte: SporTV

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