O Direito Desportivo e as oportunidades de trabalho com os megaeventos no Brasil

Fábio Menezes de Sá Filho 

Prezados leitores das colunas do IBDD,

Tratando da temática escolhida, não se pretende aprofundar o que vem a ser ou dever ser Direito, mas apenas demonstrar quando os doutrinadores optaram pela melhor técnica, ao nomear as disciplinas jurídico-desportivas, para, depois desta classificação, abordar sucintamente sobre algumas oportunidades, que poderão ser geradas pela Copa do Mundo da FIFA de 2014 e pelas Olimpíadas de 2016, que ocorrerão no Brasil.

Entende-se por Direito, a ciência que busca estudar e interpretar os fatos sociais pretéritos, presentes e futuros, os quais ao sofrerem um processo valorativo dão origem às normas, estas passíveis de serem sistematizadas, formando um ordenamento jurídico legitimado pela sociedade a ela aplicada. Por ciência, pode-se dizer que se trata de um conjunto de enunciados que completam e refinam as constatações da linguagem comum. Necessário se faz apontar a diferença geralmente estabelecida entre o conhecimento comum e o científico, no qual o primeiro seria as constatações da linguagem cotidiana, e o segundo seria as constatações cientificizadas, no sentido de a estas serem atribuídas caráter estritamente designativo ou descritivo, genérico, mas bem comprovado e sistematizado.

Ciência do Direito é uma expressão cunhada pela Escola Histórica alemã, no século XIX[fusion_builder_container hundred_percent=”yes” overflow=”visible”][fusion_builder_row][fusion_builder_column type=”1_1″ background_position=”left top” background_color=”” border_size=”” border_color=”” border_style=”solid” spacing=”yes” background_image=”” background_repeat=”no-repeat” padding=”” margin_top=”0px” margin_bottom=”0px” class=”” id=”” animation_type=”” animation_speed=”0.3″ animation_direction=”left” hide_on_mobile=”no” center_content=”no” min_height=”none”][1].

Portanto, para se delimitar se determinada constatação é científica, é necessário um método, independentemente de quantas técnicas por ela são utilizáveis. Ferraz Júnior aponta que o método utilizado pela Ciência do Direito é o analítico, o qual tenta captar o fenômeno jurídico como um fenômeno normativo, realizando uma sistematização das regras para obtenção de decisões possíveis.

O próprio método analítico pode se valer de procedimentos conclusivos: indutivo (parte de proposições particulares para o geral), dedutivo (parte de proposições gerais para o particular) ou analógico (parte de proposições particulares para o particular, utilizando o critério da semelhança, a partir da valoração dos fatos)[2].

Por outro lado, utiliza-se a dicotomia dogmática jurídica e zetética jurídica para distinguir a ciência que estuda ou guarda alguma relação com a Ciência do Direito, e, “embora entre ambas não haja uma linha divisória radical (toda investigação acentua mais um enfoque que o outro, mas sempre tem os dois), a sua diferença é importante”[3].

Zetética advém da palavra alemã zetein, significando perquirir, atestando se tratar de uma ciência preponderantemente investigativa, a qual busca o ser dos objetos de estudo, negando a existência de verdades inquestionáveis.

Dogmática tem origem no termo alemão dokein, que significa ensinar/doutrinar, partindo para uma análise do dever ser dos objetos, a qual visa a possibilitar uma decisão e orientar a ação. No entanto, releva o ato de opinar e ressalva algumas das opiniões. Existem verdades inquestionáveis, isto é, dogmas pressupostos, inatacáveis.

Enquanto que a zetética pode inclusive pôr em discussão a questão da existência de uma Entidade Divina Suprema, criadora de toda a matéria, contrariamente, a dogmática partirá do pressuposto de que Deus existe e que as criações da natureza são obras suas, sem questioná-las.

Preocupa-se assim em classificar as ramificações da Ciência do Direito, já que esta representa o plexo do universo das disciplinas jurídicas. Sobre isto, Ferraz Júnior afirma:

“(…) se percorremos os nossos manuais e tratados de Direito Civil, Direito Comercial, Direito Penal e outros, podemos assinalar neles, via de regra, duas preocupações constantes:

a) Definir cada um destes ‘ramos’ como partes de uma ‘Ciência (unitária) do Direito’.

b) Distinguir a ‘Ciência do Direito’, propriamente dita, de outras, com as quais mantém relações, em geral, de subsidiariedade. Por exemplo, Ciência do Direito Penal e Criminologia, Psicologia Forense, Sociologia Criminal e outras.

Essas duas preocupações revelam um aparente comum acordo sobre a existência de uma Ciência do Direito, nas suas diversas ramificações, e sobre a sua especificidade. Quanto ao primeiro aspecto, já o uso generalizado do termo ciência é bastante significativo. Quanto ao segundo, fala-se, freqüentemente, de ciência dogmática do Direito, para distingui-la da Psicologia, da
Sociologia, da História e outras”.

Essa mesma preocupação deve existir quando se quer direcionar o estudo para a Ciência do Direito e sua relação com o esporte.

É comum visualizar a doutrina desportiva querer atribuir autonomia ao Direito Desportivo, no sentido de este ser um ramo da Ciência do Direito que abarcaria toda disciplina jurídica, que guardasse relação com o esporte. De fato, poder-se-ia afirmar isto com algumas ressalvas.

Uma delas é que o único objeto de estudo tratado de maneira autônoma pelo Direito Desportivo é o que for oriundo de matéria disciplinar e de competição.

Portanto, o Direito Desportivo, propriamente dito, enquanto possuidor de normas de natureza material e de natureza processual, isto é, respectivamente, Direito Disciplinar Desportivo e Direito Processual Disciplinar Desportivo, é o ramo da Ciência do Direito que visa a estudar as matérias que envolvem aspectos disciplinares, a partir dos regramentos das competições esportivas, representados de maneira preponderante pelo Código Brasileiro de Justiça Desportiva. Aquele é o único ramo jurídico autônomo, que trata de matéria desportiva.

Nesse viés, a ramificação da Ciência do Direito que estuda as relações trabalhistas dos desportistas, não é o Direito Desportivo do Trabalho, e, igualmente, os atos tipificados como criminosos ocorridos nas praças desportivas não serão objeto de estudo de um Direito Desportivo Penal. Tecnicamente, por uma questão de adequação, dever-se-ia chamar aquele de Direito Laboral Desportivo e este de Direito Penal Desportivo, pois antes de serem compreendidos pelo aspecto desportivo, tais ramos são estudados por uma matriz disciplinar prévia, respectivamente, o Direito do Trabalho e o Direito Penal.

Sendo assim, o plexo do Direito Desportivo poderia ser considerado exemplificativamente formado pelas seguintes disciplinas jurídicas, autônomas e não-autônomas:

a) Direito Disciplinar Desportivo e Direito Processual Disciplinar Desportivo, as únicas autônomas;

b) Direito Constitucional Desportivo;

c) Direito Ambiental Desportivo;

d) Direito Civil Desportivo;

e) Direito Empresarial Desportivo;

f) Direito do Consumidor Desportivo;

g) Direito Laboral Desportivo;

h) Direito Penal Desportivo;

i) Direito Tributário Desportivo;

j) Direito Previdenciário Desportivo;

k) etc.

Por fim, aproveita-se para ressaltar mais uma vez que não se quis dar uma opinião aprofundada a respeito do estudo da Ciência do Direito, e muito menos se visou esgotar a menção às disciplinas não-autônomas desta ciência que guardam alguma relação com o esporte.

Por outro lado, é flagrante a quantidade de oportunidades, que terão os diversos profissionais, já em atividade, e os estudantes de cursos de graduação e de cursos técnicos, que estarão qualificados antes, durante e após dois megaeventos a serem realizados no Brasil: a Copa do Mundo da FIFA de 2014 e os Jogos Olímpicos de Verão de 2016 (cuja sede será o Rio de Janeiro-RJ).

Dentro das grandes áreas do campo do saber, a área de saúde é a mais defasada com relação aos profissionais, que possuem especialização em questões afetas ao desporto. É muito raro encontrar um médico, fisioterapeuta, nutricionista, enfermeiro, odontólogo, entre outros, que possuem especialização nesse sentido. Isso fica notório quando se questiona aos colegas quem eles conhecem que atuam nessas atividades. Os poucos que podem ser achados atuam nos grandes centros urbanos, principalmente nos estados de São Paulo, do Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.

A construção e reforma, por exemplo, de estádios e arenas poliesportivas, e a realização de obras de infra-estrutura urbana (o que inclui hotéis, aeroportos, vias públicas, etc.) vão gerar diversos empregos na área das diversas engenharias. Esse talvez seja o campo do saber, cujas atividades sejam mais facilmente identificadas, em relação aos profissionais, que possuem conhecimento suficiente para contribuir com as obras específicas voltadas para os eventos desportivos acima listados.

Por outro lado, muitas oportunidades serão geradas na área das atividades ligadas ao tratamento com seres humanos, como as desempenhadas por advogados e consultores jurídicos, psicólogos, administradores, tradutores, economistas, contadores, arquitetos [4], entre outras.

Não se pode esquecer que essas atividades tanto podem ser exercidas diante de empresas privadas quanto junto a algum órgão governamental.

Especificamente aos que lidam com o Direito Desportivo, diversos cursos de qualificação irão abrir espaço para consultores e professores da área. Advogados especializados serão necessários para lidar com as infindáveis demandas, que surgirão nos próximos anos.
Concluindo, trata-se de um momento altamente propício para quem quiser se especializar em alguma atividade ligada ao desporto. Recomenda-se apenas que no currículo conste um único requisito: ser apaixonado, de alguma forma, por esportes.

NOTAS

[1] FERRAZ JÚNIOR, Tercio Ferraz. A ciência do direito. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1980. p. 18.

[2] FERRAZ JÚNIOR, Tercio Ferraz. A ciência do direito. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1980. p. 53.

[3] FERRAZ JÚNIOR, Tercio Ferraz. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão e dominação. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1994. p. 41.

[4] A arquitetura é uma das ciências que os cientistas atualmente possuem certa dificuldade de enquadrá-lo como integrante da área de humanas, exatas ou uma quarta grande área: a das artes. Por não ser objetivo deste estudo enfrentar este problema, apenas utilizou-se da classificação que costumeiramente é bem aceita, inclusive pelos próprios arquitetos, que se sentem lisonjeados por saber que estão lidando com seres humanos.

Fábio Menezes de Sá Filho é Mestre em Direito pela UNICAP; Especialista em Direito Judiciário e Magistratura do Trabalho pela ESMATRA VI; Professor do Curso de Graduação em Direito da FADIC e do Curso de Direito Desportivo da ESA/PE; Membro da AIDTSS, do IBDD e da Comissão de Direito Desportivo da OAB/PE; Presidente do Conselho Fiscal e Associado-Fundador do IPDD; Presidente do Conselho de Ética do INAMA/PE; e Advogado. E-mail: [email protected][/fusion_builder_column][/fusion_builder_row][/fusion_builder_container]

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